LIVRO: Origem da Engenharia = PDF DOWNLOAD
INSTITUTO FEDERAL DE EDUCAÇÃO, CIÊNCIA E
TECNOLOGIA DE SANTA CATARINA
Unidade Curricular de Engenharia e Sustentabilidade
Histórico
A evolução da humanidade se processa de forma contínua, mas, volta e meia, têm-se observado alguns saltos esporádicos de maior transformação.
Grandes avanços científicos ocorrem quando invenções tecnológicas inovadoras chegam ao mercado consumidor.
Isso acontece basicamente em duas oportunidades: grandes crises – guerras ou catástrofes naturais, por exemplo -, ou quando diversos fatores propícios para tal se juntam.
Em todas as ocasiões, o trabalho dos engenheiros é de fundamental importância para o desenvolvimento da sociedade.
Olhando para o passado, podemos perceber inúmeros progressos atingidos pelo homem ao longo das eras: o controle do fogo, a domesticação dos animais, a invenção da agricultura, a criação de cidades, o desenvolvimento da imprensa ou ainda a construção de um avião comercial.
Um dos grandes diferenciais do ser humano é sua habilidade técnica.
Essa habilidade pode ser percebida há 2 milhões de anos, quando os hominídeos já fabricavam ferramentas rudimentares para a prática da caça.
Acredita-se que o grande ponto de virada foi a descoberta da alavanca, o polimento de pedras e o domínio do fogo.
Há cerca de 12 mil anos ocorreram outros avanços significativos como a domesticação dos animais, a agricultura, a modelagem da cerâmica, o surgimento do vinho e da cerveja.
Com a nova revolução técnica, surge um novo modelo de organização social.
Em função dessa nova organização, o homem sente a necessidade de novas descobertas e realização de obras de maior porte.
Há cerca de 4,5 mil anos foram construídas as pirâmides de Gizé, no Egito.
A técnica faz diferença
Após as eras da pedra lascada e da pedra polida, o ser humano começa a descoberta dos metais.
O cobre e o estanho foram os primeiros metais manipulados pelo homem durante a chamada Idade do Bronze.
Eram utilizados para a fabricação de elementos de caça e
defesa.
Acredita-se que por volta de 2 mil a.C. o homem descobriu o processo de fundição dos metais.
Na mesma época é descoberta a roda e inicia-se a construção de máquinas simples.
Isso possibilitou uma nova mudança na sociedade, com a construção de templos, aquedutos, estradas e palácios.
Nesse mesmo período, os egípcios utilizavam o papiro para a escrita e já canalizavam a água do rio Nilo para a irrigação do solo.
Os povos mediterrâneos e escandinavos desenvolviam técnicas mais aprimoradas para a construção de navios.
Os chineses inventam a pólvora, a imprensa escrita e a bússola magnética. Além disso, ainda observam o céu para a compreensão de alguns fenômenos presentes a sua volta.
Ao longo dos séculos ocorreu a evolução tecnológica que alcançada por artesãos, de maneira empírica, que passavam seus conhecimentos a outras gerações.
Nessa época as habilidades técnicas eram tidas como presentes dos deuses, sendo passado apenas aos escolhidos.
As civilizações que detinham certo nível de tecnologia levavam grande vantagem sobre aquelas que não o detinham. Isso acarretou nas primeiras dominações de uns povos sobre os outros.
Um marco importante para a disseminação do conhecimento ocorreu por cerca de 1450, quando Gutenberg (1400-1468) mecanizou a imprensa escrita, tornando a impressão mais rápida.
Dessa forma o conhecimento começa a fluir de maneira mais rápida e abrangente, uma vez que anteriormente ele era transmitido verbalmente ou através de raros papiros.
Surgimento da Engenharia moderna
Desde os primórdios as técnicas mudaram muito, sendo
aprimoradas de maneira significativa.
Surge o conhecimento teórico, para fundamentar tudo o que a prática pudesse desenvolver.
Nesse processo de evolução, surge um profissional focado na solução de problemas que em um primeiro momento não considerava tanto os aspectos teóricos, mas sim os práticos.
Construíam estruturas, instrumentos, processos e dispositivos com base em observações passadas.
Com a expansão do conhecimento científico, aplicado aos problemas práticos, nasce a figura do Engenheiro.
Aos poucos a Engenharia vai se estruturando, fruto da evolução da matemática, da interpretação dos fenômenos físicos e de experimentos realizados em ambiente controlado.
No século 18 já havia se chegado a uma série de doutrinas que deram origem a um novo tipo de Engenharia. Essa sistemática representa um marco divisório entre a Engenharia antiga e a Engenharia moderna.
A Engenharia antiga se caracterizava pelo empirismo, pois esse Engenheiros trabalhavam com base em conhecimentos passados por antecessores ou ainda com base na sua própria experiência através da observação.
A Engenharia moderna se caracteriza pela utilização do conhecimento científico para a resolução dos problemas, ou seja, tem uma fundamentação teórica.
São levados em conta conhecimentos como a estrutura da matéria, os fenômenos eletromagnéticos, a composição química dos materiais, as leis da mecânica, a transferência de energia e as modelagens matemáticas dos fenômenos físicos.
Marcos históricos importantes
A tecnologia, como a conhecemos hoje, só começou a surgir há 400 anos atrás. Porém a mesma só teve grande aceleração durante a Revolução Industrial (1760-1840).
Mas para isso, alguns avanços e descobertas anteriores foram necessários.
Um dos grandes antecessores dessa época foi Leonardo da Vinci (1452-1519), que reunia o conhecimento teórico e o prático.
Entre os projetos idealizados por da Vinci estão uma roda d’água horizontal cujo princípio foi usado na construção da turbina hidráulica, máquinas de escavação, cidades, portos e máquinas voadoras, além de seus estudos científicos – por exemplo sobre a anatomia humana – e obras de arte reverenciadas até hoje.
Em 1590, o físico Galileu, disposto a por à prova alguns ensinamentos de Aristóteles, teria convidado membros da Universidade de Pisa para assistir a uma experiência: a queda livre simultânea de dois corpos de pesos diferentes.
Galileu estudou, por exemplo, problemas de levantamento de pesos, inventou o termômetro, investigou as leis de gravitação e oscilação e pôs à prova antigos ensinamentos aristotélicos.
Devemos lembrar que a ciência de Aristóteles vigorou por cerca de 2 mil anos, e que só foi desbancada consistentemente por volta do século 17.
Um marco da aplicação da ciência moderna na engenharia é o trabalho publicado em 1638 por Galileu – Discurso sobre duas novas ciências -, onde é deduzido o valor da resistência à flexão de uma viga engastada numa extremidade e suportando um peso de sua extremidade livre.
Porém nem só de experimentos bem sucedidos vive a Engenharia. Podemos citar uma série de exemplos mal sucedidos:
- os esforços malogrados de Leibniz na instalação de bombas movidas por moinhos de vento, para controlar águas de minas;
- fracasso de Huyghens no desenvolvimento de um motor eficiente de explosão a pólvora;
- a incapacidade de três matemáticos de renome, em 1742, nomeados pelo Papa, para descobrir as causas dos sinais de colapso apresentados no domo da basílica de São
Além desses exemplos, outros casos curiosos podem ser citados:
- em 1778, Frederico, o Grande, numa carta a Voltaire, ridicularizava Euler por não ser capaz de projetar, por meios matemáticos, fontes para o seu jardim;
- os resultados do trabalho de Galileu, publicado em 1638, cuja distribuição de tensões proposta estava
Contudo, uma infinidade de aplicações bem-sucedidas de teorias científicas a problemas práticos garantiu a afirmação da engenharia moderna.
Um exemplo ocorreu no final do século 18, quando Coulomb calculou com boa precisão a resistência à flexão de vigas horizontais em balanço, e também elaborou um método para o cálculo de empuxos de terra sobre muros de arrimo, com validade até hoje.
Um fato marcante na evolução industrial foi a implantação da máquina a vapor na indústria da tecelagem, ocorrida por volta de 1782, fato que, aliás, junto com o tear mecânico, inventado pelo inglês Cartwright em 1785, foi um dos grandes responsáveis pela Revolução Industrial.
Outro grande avanço no processo de industrialização foi a utilização do motor elétrico como fonte de energia, que substituiu equipamentos como rodas d’água e cataventos.
O primeiro gerador elétrico experimental foi construído pelo fabricante francês de instrumentos Hippolyte Pixii, em 1832.
Entretanto, apenas em 1871 foi utilizado, na prática, o primeiro motor elétrico. O construtor deste motor, Gramme, foi um prático que, tal qual os inventores do telefone e do rádio, desconhecia as explicações científicas para os seus inventos.
A Engenharia como profissão oficial
Segundo historiadores, o primeiro emprego, do termo engenheiro -proveniente da palavra latina ingenium, que significa engenho ou habilidade – foi feito na Itália.
Oficialmente, esta designação apareceu pela primeira vez numa ordem régia de Carlos V (1337-1380), da França, mas apenas no século 18 é que começou a ser utilizada para identificar aqueles que faziam técnicas com base em princípios científicos.
Antes disso, este termo designava aqueles que se dedicavam ao invento e à aplicação de engenhos.
Apenas em 1814 é que o termo engenharia foi dicionarizado em língua portuguesa.
O primeiro título de engenheiro foi usado pelo inglês John Smeaton (1724-1792), que teria se auto-intitulado engenheiro civil.
Inicialmente esta designação serviu em muitos países para definir toda a engenharia que não se ocupava de serviços públicos ou do Estado; em outros países compreendia toda a engenharia com exceção da militar.
As primeiras escolas de Engenharia
Ainda no século 18, vários cientistas franceses, tais como Siméon Denis Poisson (1781-1840), Claude-Louis Navier (1785-1836), Gustave-Gaspard Coriolis (1792-1843), Jean Victor Poncelet (1788-1867) e Gaspar Monge (1746-1818), contribuíram para a definição da técnica científica, que resultou na fundação, em Paris, em 1774, da Ecole Polytechnique, que tinha como finalidade ensinar as aplicações da matemática aos problemas da engenharia.
Porém, já em 1506, foi fundada em Veneza – pelo holandês Adrian Willaert (1490-1562) – a primeira escola dedicada à formação de engenheiros e artilheiros.
Por volta do século 18, houve um significativo desenvolvimento técnico em áreas tais como: extração de minérios, siderurgia e metalurgia.
O mesmo desenvolvimento também foi sentido na construção de pontes, estradas e canais, o que formava a base da engenharia civil.
Todas estas atividades sempre foram fruto do trabalho de práticos, que desenvolviam empiricamente suas atividades, alheios às teorias científicas.
Com base em desenvolvimentos como esses, a engenharia evolui cada vez mais rapidamente, sempre intimamente relacionada com o aparecimento de escolas para a formação de engenheiros.
Como consequência disso, em 1747 foi criada na França aquela que é considerada a primeira escola de engenharia do mundo, a Ecole des Ponte et Chaussées.
Em 1778 foi implantada a Ecole des Mines e, em 1794, o Conservatoire dês Arts et Métiers.
Estas escolas eram voltadas para o ensino prático, diferentes portanto da Ecole Polytechnique, estabelecendo, assim, uma divisão da engenharia em dois campos: o dos engenheiros práticos e o dos teóricos.
Para o desenvolvimento da engenharia, o passo seguinte foi a criação das escolas técnicas superiores nos países de língua alemã.
As escolas de Praga (1806), de Viena (1815), de Karlsruhe (1825) e de Munique (1827) são exemplos neste sentido.
Entretanto, a escola que maior importância teve no aparecimento da engenharia moderna foi a de Zurique (1854) – Eidgenossische Technische Hochschule.
Nos Estados Unidos, as primeiras escolas deste tipo foram o MIT – Massachusetts Institute of Technology – (1865), o Califórnia Institute of Technology (1919) e o Carnegie Institute of Technology (1905).
Porém, talvez a mais característica escola de engenharia dos EUA foi o Rensselaer Polytechnic Institute, fundada em 1824.
Entretanto, já em 1794 havia sido criada a primeira escola de engenharia nos EUA, a Academia Militar de West Point, que foi destruída por um incêndio dois anos depois, sendo reaberta em 1802 – ano considerado o oficial da sua fundação.
Com essas escolas e institutos, a técnica moderna tomou corpo, ampliando-se a aplicação da ciência à tecnologia.
Deve ser registrada uma diferença fundamental entre as primeiras escolas de engenharia e as atuais.
As primeiras treinavam para técnicas e processos. Hoje, a preocupação maior é sobretudo formar e educar – para fornecer ao futuro profissional embasamento teórico consistente para que ele possa atuar com competência e também resistir ao rápido obsoletismo das técnicas -, e secundariamente treinar.
Fatos marcantes da ciência e da tecnologia
Alguns fatos históricos relativos à evolução das técnicas e da ciência têm importância marcante na definição do estágio atual de desenvolvimento da engenharia. Listamos alguns deles.
- 1620 Francis Bacon preconiza o método experimental
- 1637 René Descartes publica o primeiro tratado da geometria analítica e formula as leis da refração
- 1642 Blaise Pascal constrói a primeira máquina de calcular
- 1660 é estabelecida a Lei de Hooke, princípio básico para o estudo da Resistência dos Materiais, ciência básica das engenharias
- 1674 o cálculo infinitesimal, ferramenta básica para a análise matemática, é inventado por Newton e Leibniz
- 1729 Stephen Gray descobre que há corpos condutores e não condutores de eletricidade
- 1745 Ewald Jurgen Von Kleist inventa o capacitor elétrico
- 1752 Benjamin Franklin inventa o pára-raios
- 1764 James Watt inventa o condensador, componente fundamental para o motor a vapor
- 1768 Gaspar Monge cria a geometria descritiva
- 1775 Pierre Simon inventa a turbina d’água
- 1789 Antoine Laurent Lavoisier enuncia a lei da conservação da massa
- 1790 Lavoisier publica a tábua dos trinta e um primeiros elementos químicos
- 1800 Alessandro Volta constrói a primeira bateria de zinco e chapas de cobre
- 1802 Joseph Gay Lussac formula a lei da dilatação dos gases
- 1805 Joseph Fourier formula a teoria do desenvolvimento
das funções em séries trigonométricas
- 1811 Amedeo Avogadro formula a hipótese sobre a composição molecular dos gases
- 1814 George Stephenson constrói a primeira locomotiva
- 1819 Hans Oerstedt descobre o eletromagnetismo
- 1824 Sadi Carnot cria a termodinâmica
- 1825 Nielson constrói o primeiro alto-forno
- 1831 Michael Faraday descobre a indução eletromagnética
- 1834 Charles Babbage inventa a máquina analítica – ancestral do computador
- 1837 Samuel Morse inventa o telégrafo elétrico
- 1855 Henry Bessemer constrói o primeiro conversor para produção do aço
- 1867 Joseph Monier inventa o processo de construção de concreto reforçado
- 1878 Thomas Edison inventa a lâmpada elétrica
- 1885 Gottlieb Daimler e Karl Benz constroem o primeiro automóvel
- 1891 é construída a primeira linha de transmissão
elétrica, em corrente alternada
- 1892 Rudolf Diesel estuda, inventa e patenteia, e em seguida produz industrialmente, o seu motor de combustão
Estes são apenas alguns exemplos da arrancada decisiva da conjugação da ciência à tecnologia que, a partir daí, cada vez mais se complementam e entrelaçam.
Porém, a tecnologia só se firmaria como atividade importante no início do século 20
Início da Engenharia no Brasil
Não se sabe ao certo quando ocorreu o início da Engenharia no Brasil. Porém pode-se afirmar que ela se estabeleceu efetivamente com a construção de casas pelos colonizadores.
Em seguida, vieram as primeiras obras de defesa: muralhas e fortes.
Porém a Engenharia começou a tomar o modelo que conhecemos hoje a partir das atividades dos oficiais- engenheiros e dos mestres construtores de edificações civis e religiosas.
O desenvolvimento da engenharia no Brasil manteve-se por muito tempo atrasado.
Isso aconteceu pelo fato de a economia ser baseada na escravidão – que representava uma mão-de-obra bastante barata -, não sendo do interesse da monarquia a instalação de indústrias na sua colônia.
A referência mais antiga com relação ao ensino da engenharia no Brasil – conforme citado por Pedro C. da Silva Telles em seu livro História da Engenharia no Brasil — parece ter sido a contratação do holandês Miguel Timermans, entre l648 e 1650, para aqui ensinar sua arte e ciência.
Muitas outras iniciativas semelhantes foram, com o tempo, escrevendo o início da história do ensino da engenharia no Brasil, porém sempre de forma sazonal ou ainda muito incipiente.
A primeira escola de engenharia propriamente dita – a Academia Real Militar – foi criada em 4 de dezembro de 1810 pelo príncipe Regente – futuro Rei D. João VI -, vindo a substituir a Real Academia de Artilharia, Fortificações e Desenho, esta instalada em 17 de dezembro de 1792.
Com o passar dos anos a Academia Real Militar sofreu várias reformas e transformações.
Depois da Independência, teve seu nome mudado para Academia Imperial Militar e, mais tarde, para Academia Militar da Corte.
Em outubro de 1823, um decreto permitiu a matrícula de alunos civis, que não mais eram obrigados a fazer parte do Exército.
Outras transformações ocorreram até que, pelo decreto n° 2.116, de primeiro de março de 1858, através de nova organização das escolas militares, a Escola Militar da Corte passou a denominar-se Escola Central, sendo então destinada ao ensino das Matemáticas e Ciências Físicas e Naturais e, também, das doutrinas próprias da Engenharia Civil.
Com estas modificações, o ensino militar ficou a cargo da Escola de Aplicação do Exército, agora denominada Escola Militar e de Aplicação do Exército, e da Escola Militar do Rio Grande do Sul.
Em 25 de abril de 1874, através do decreto nº. 5.600, foi criada a Escola Politécnica do Rio de Janeiro, sucessora da antiga Escola Central.
Também no Segundo Império, foi criada a Escola de Minas de Ouro Preto, em 12 de outubro de 1876.
Ainda no século 19, mais cinco escolas de engenharia foram implantadas: em 1893, a Politécnica de São Paulo; em 1896, a Politécnica do Mackenzie College e a Escola de Engenharia do Recife; em 1897, a Politécnica da Bahia e a Escola de Engenharia de Porto Alegre.
Até 1946 já existiam 15 instituições de ensino de engenharia e, de lá para cá, muitas outras foram implantadas no país, o que representa, hoje, algumas centenas de cursos.
Textos extraídos de:
– BAZZO, W.A.; PEREIRA, L.T.V. Introdução à
Engenharia. 6ª ed., Florianópolis: Ed. da UFSC, 2002. 271p.