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O Código Brasileiro de Telecomunicações: Considerações Acerca do Marco Legal
Euclides Quandt de Oliveira 1
Os Primórdios da Telefonia
O Código Brasileiro de Telecomunicações, aprovado pela lei 4.117 de 27 de agosto de 1962, foi a base do crescimento das telecomunicações brasileiras. Para se distinguir bem a importância do seu papel, vale a pena se observarem alguns pontos que marcam a evolução das comunicações telefônicas no Brasil. Elas surgiram bem cedo, logo depois de o imperador D. Pedro II ter encontrado, em 1877, na Filadélfia, Graham Bell expondo sua invenção, o telefone. Após esse ligeiro relâmpago inicial, devido à falta de uma regulação adequada, a telefonia brasileira permaneceu quase estacionária, não acompanhando de perto as melhorias que ocorriam no resto do mundo. Durante muitos anos, para a remessa de mensagens importantes a locais distantes, as pessoas e empresas usaram apenas telegrafia. Podemos listar alguns fatos que marcaram a evolução interna das nossas comunicações:
- 11 de maio de 1852 – Inaugurada a primeira linha de telégrafo elétrico no Brasil, no Rio de Janeiro, entre o Palácio Imperial da Quinta da Boa Vista e o Quartel do Campo.
- 17 de janeiro de 1854 – O imperador Pedro II nomeou o Ministério da Justiça como Controlador Geral Telegráfico.
- Janeiro de 1857 – Entrou em operação a segunda linha telegráfica no País, entre o Rio de Janeiro e Petrópolis.
- 28 de junho de 1860 – A administração dos telégrafos tornou-se responsabilidade do Ministério da Agricultura, Comércio e Obras Públicas.
1 Euclides Quandt de Oliveira é Oficial de Marinha Reformado, especialista em Eletrônica. Durante seu serviço na Marinha fez vários cursos nessa área, no Brasil e nos Estados Unidos. De 1965 a 1967 exerceu o cargo de Presidente do Conselho Nacional de Telecomunicações; de 1972 a 1974, foi Presidente da Telebrás e, de 1974 a 1979, foi Ministro das Comunicações. É autor dos livros Renascem as Telecomunicações – volume 1. Construindo a Base (Editel Gráfica e Editora, 1992) e Renascem as Telecomunicações – volume 2. Construção e Operação do Sistema (Editora Landscape, 2006).
- 22 de junho de 1874 – Inaugurada a primeira linha telegráfica para o exterior, por cabo submarino, entre o Brasil e Portugal.
- 1877 – Na Filadélfia, Pedro II conheceu a nova invenção que estava sendo apresentada por Graham Bell, o telefone. De regresso ao Rio de Janeiro, logo determinou a instalação de linhas telefônicas entre o palácio imperial, as residências dos ministros, a Polícia e os Bombeiros.
- 1877 – Instalada a primeira linha telefônica pública, no Rio de Janeiro, ligando uma loja ao Corpo de Bombeiros.
- 1878 – Efetuada a primeira ligação interurbana, entre São Paulo e Campinas.
- 15 de novembro de 1879 – Decreto imperial autorizou a instalação e operação de linhas telefônicas no Rio de Janeiro, seus subúrbios e Niterói.
- 1879 – Em virtude da confusão que estava ocorrendo nas ruas, pela colocação individual de fios para telefones, foi assinado decreto determinando que os fios para telecomunicações, mesmo os destinados a uso particular, só poderiam ser instalados pela Diretoria de Telégrafos.
- 12 de agosto de 1881 – Resolução do Imperador determinou que as linhas telefônicas, assim como as telegráficas, pertenciam exclusivamente ao Estado e cabia ao Governo Imperial o direito de concedê-las, inclusive para uso
- 21 de agosto de 1881 – Publicada a primeira lista telefônica brasileira, no Rio de
- 1885 – Existiam no Rio de Janeiro três companhias telefônicas e 1.675 assinantes.
- 2 de maio de 1890 – Decreto do governo republicano determinou que as linhas telegráficas e telefônicas da República dos Estados Unidos do Brasil eram propriedade da Federação e destinadas ao serviço da Administração Pública e dos particulares.
- 28 de maio de 1922 – A Companhia Radiotelegráfica Brasileira – Radiobrás, empresa norte-americana, iniciou serviços de radiotelegrafia e radiotelefonia com o exterior.
- 1922 – Instalada em Porto Alegre a primeira central brasileira de serviço telefônico automático.
- 13 de julho de 1928 – Inaugurado o serviço telefônico automático na cidade de São
- 27 de maio de 1931 – Decreto 047 regulou a execução dos serviços de radiocomunicação no território nacional.
- 1º de março de 1932 – Decreto 21.111 aprovou o regulamento para a execução dos serviços de radiocomunicação no território nacional.
- 31 de maio de 1944 – A Radional, empresa norte americana, foi autorizada a instalar serviço de radiocomunicações nas capitais dos estados e territórios, e a efetuar o respectivo serviço interurbano
- 27 de agosto de 1962 – A lei 4117 aprovou o Código Brasileiro de Telecomunicações.
As Telecomunicações no Brasil antes de 1962
Até a época da II Guerra Mundial, as telecomunicações brasileiras resumiam-se nas ligações telefônicas e telegráficas e na radiodifusão (sem televisão). A legislação existente, de 1931 e 1932, só fazia menção às ligações telefônicas efetuadas por meio de equipamentos de rádio e, quando julgado necessário, era feita extrapolação dessas normas para serem aplicadas em telefonia. O público usuário mostrava alguma insatisfação em relação ao serviço telefônico, porém sem muitas reclamações a respeito. As pessoas não estavam habituadas a se comunicar frequentemente com aqueles que estavam muito longe. Nas áreas onde existia uma concessionária prestando serviços locais e o intraestadual, havia um maior uso da telefonia a longa distância, porém não eram muitas as cidades atendidas dessa maneira. Adicionalmente, não existia um Órgão Regulador, nem normas para o funcionamento das redes telefônicas. Elas eram instaladas com equipamentos vindos do exterior, provenientes de diferentes países; em conseqüência, não havia facilidade de intercomunicação entre tais redes, já que cada país tinha as suas regras e características de funcionamento. O primeiro dispositivo legal, referente às radiocomunicações, foi estabelecido pelo decreto 20.047 de 27 de maio de 1931, que “regula a execução dos serviços de radiocomunicações no território nacional” e inclui, entre eles, “a radiotelegrafia, a radiotelefonia, a radiotelevisão e quaisquer outras utilizações de radioeletricidade para a transmissão ou recepção, sem fio, de escritos, imagens, sinais ou sons de qualquer natureza por meio de ondas hertzianas” (art. 2º). Na realidade, a idéia predominante era que a radiodifusão destinava-se exclusivamente à educação. O art.12 desse decreto e seus parágrafos estabeleciam que:
“o serviço de radiodifusão é considerado de interesse nacional e de finalidade educacional.
- 1º O Governo da União promoverá a unificação dos serviços de radiodifusão, no sentido de constituir uma rede nacional, que atenda aos objetivos de tais serviços. (…)
- 3º A orientação educacional das estações da rede nacional de radiodifusão caberá ao Ministério da Educação e Saúde Pública e a sua fiscalização técnica competirá ao Ministério da Viação e Obras Públicas.”
Adicionalmente, o art. 13 fixava que “os serviços das atuais sociedades de radiodifusão continuarão a ser executados, a título precário.”. Pelo art. 29 foi criada a Comissão Técnica de Rádio, constituída por três membros, que teria como objetivo a realização de estudos e, principalmente, a verificação do local em que seriam instaladas as estações. Sua atuação foi de pouca significação para o setor de telecomunicações, embora tenha sido formalmente substituída pelo Conselho Nacional de Telecomunicações em 1962. Em 1º de março de 1932, pelo decreto 21.111, foi aprovado o regulamento para a “execução dos serviços de radiocomunicação no território nacional”, a que se referia o decreto 20.047 de 1931. Esse regulamento continha 109 artigos. É interessante notar que esses dois documentos eram simples e, apesar de serem longos, não continham referências diretas às atividades de telefonia.
O primeiro tinha como finalidade regular a execução dos serviços de radiocomunicações e, em sua descrição, foi enfatizado que ele só se referia a serviços via rádio, o que ainda foi salientado pela frase “por meio de ondas hertzianas”. Dessa forma, ele não incluía comunicações via cabos, como era a telefonia local. O decreto 21.111 era um simples regulamento do decreto 20.047, portanto ele não podia ir além do que nele constava. Depois desses dois decretos, alguns pequenos documentos legais foram expedidos, porém de abrangência reduzida. Em consequência, todo o serviço telefônico foi prestado e fiscalizado com base nesses dois decretos, porém legalmente eles não tinham efeito sobre a telefonia. Até ser aprovado o Código Brasileiro de Telecomunicações, todas a discussões se baseavam no decreto 21.111.
O primeiro serviço telefônico interurbano em âmbito nacional, entre diferentes estados e entre diferentes concessionárias, foi outorgado à Radional, subsidiária da empresa americana International Telephone and Telegraph Co – ITT, em 1944. Esse serviço atendia às capitais dos Estados e Territórios, porém, na maioria delas, não havia ligação com a rede local e o usuário,
mesmo tendo em sua casa um terminal telefônico local, tinha de se deslocar à agência da Radional para receber ou fazer ligações e às grandes cidades. Esse serviço foi estendido a algumas outras cidades de grande população.
O primeiro governo brasileiro após o conflito mundial de 1939 -1945, do presidente Eurico Gaspar Dutra, lançou o Plano Salte de investimento econômico, visando atender às necessidades reais do País, porém coerente com a nossa situação. Esse plano não incluiu, nem fez referência às telecomunicações O governo seguinte, de Juscelino Kubitscheck, promoveu o Plano de Metas, de maior amplitude, mas que também nada incluiu relativamente às telecomunicações.
O Plano de Metas de Juscelino teve um resultado positivo quanto à economia do Brasil e, em pouco tempo, o crescimento da economia fez com que o setor empresarial começasse a mostrar inquietação e inconformidade em relação ao serviço telefônico. Juscelino, motivado pelas reclamações feitas, mandou que fosse analisada a situação desse setor e fixada a melhor forma de remediar os problemas existentes. Foi constituído um Grupo de Trabalho com essa responsabilidade, o qual efetuou um meticuloso levantamento da situação e concluiu que a causa principal da falta de investimentos na expansão da rede telefônica residia nas tarifas excessivamente baixas vigentes no setor. A ampliação dos estudos indicou que as baixas tarifas eram consequência da atuação errônea das Assembléias Municipais, então responsáveis únicas pela fixação desses valores.
De acordo com as constituições sucessivamente vigentes no País, os serviços telefônicos locais e intraestaduais, eram respectivamente de responsabilidade do Município e do Estado. O maior problema ocorria nos serviços municipais, impulsionado por três fatores: a longa duração de implantação de um projeto de expansão telefônica, a duração do mandato dos vereadores e a inflação, que começava a aparecer. Somente a partir da década de 1940, com a operação interurbana da Radional, o telefone passou a ser considerado, pelo público, como um possível meio de comunicação entre localidades de diferentes estados. Até então, ele era considerado como sendo apenas um meio de comunicação local e qualquer mensagem para locais distantes era enviada por meio de telegramas.
O interesse político pessoal predominava nas decisões dos vereadores, que eram os responsáveis pela fixação do valor da tarifa. Antes do início do período inflacionário, as tarifas a serem cobradas eram estabelecidas no contrato de concessão dos serviços telefônicos. Quando a inflação começou crescer, as concessionárias passaram a pedir reajuste tarifário por ocasião das
expansões das redes telefônicas, as quais também deviam ser aprovadas pela Câmara Municipal. Quando era apresentado um projeto de novas instalações telefônicas, a concessionária solicitava um reajuste tarifário para compensar, em tese, o efeito inflacionário. Essa modificação do contrato de concessão era submetida à Câmara de Vereadores que, na maioria dos casos, não a aprovava, porque receava que ela viesse a ter efeito político-eleitoral negativo. Um projeto de expansão tinha a duração de três a cinco anos e, em consequência, o efeito positivo do novo serviço só afetaria o mandato eleitoral seguinte. Além disso, nas eleições que seriam efetuadas antes dessa entrada em operação, o aumento tarifário poderia ser usado pelos adversários políticos dos atuais vereadores. O Governo Juscelino efetuou vários contatos e tentativas de entendimento com os Legislativos Municipais, porém sem sucesso. Foi tomada a decisão de transferir para o Estado Maior das Forças Armadas (EMFA) a responsabilidade pelo encontro de uma solução. No EMFA, com a criação de uma Comissão Permanente de Comunicações responsável pelo assunto, logo se verificou que, no Congresso Nacional, encontravam-se em andamento alguns anteprojetos de lei para a radiodifusão, que passaram a ser acompanhados de perto.
A Aprovação do Código Brasileiro de Telecomunicações
A radiodifusão brasileira estava passando por uma situação de instabilidade legal, porque a legislação vigente ainda datava de 1931 e 1932, complementada por vários decretos-leis, decretos e portarias. A primeira estação transmissora de radiodifusão no Brasil foi a Rádio Clube de Pernambuco, inaugurada em Recife em 6 de abril de 1919, por Oscar Moreira Pinto. A primeira transmissão de radiodifusão no Rio de Janeiro ocorreu em 1923, feita pela Rádio Sociedade, fundada por Roquete Pinto e Henry Morize.
Com a instalação de grande número de estações de radiodifusão e o aumento de sua audiência, as empresas de radiodifusão fizeram esforços para mudar as definições em vigor. Como já mencionado, a idéia fixada nos decretos de 1931 e 1932 era de que a radiodifusão era apenas um instrumento educacional e governamental. Em 1934 foi organizada a Federação Paulista das Sociedades de Radiodifusão, que passou a defender a modificação da legislação. Em 1940 foi constituída uma comissão para elaborar um estatuto para a radiodifusão, o que foi realizado. O documento, com o título de Código Brasileiro de Radiodifusão, foi apresentado ao
Governo como sugestão. Entretanto o trabalho não teve prosseguimento, provavelmente porque o Congresso Nacional fora fechado pelo Estado Novo. Outras tentativas foram feitas, em 1944 e 1946, sempre sem haver posterior andamento. Em 1947 foi novamente apresentado, na Câmara dos Deputados, um anteprojeto de lei para o Código Brasileiro de Radiodifusão. Esse anteprojeto foi muito discutido em Comissões da Câmara, porém não chegou a ser votado. Durante esse tempo, o grupo jornalístico dos Diários Associados passou a crescer muito, a controlar o mercado de radiodifusão e, provavelmente por essa razão, não se interessava por uma nova legislação. A partir de 1951, quando a televisão começou a operar no Brasil, os Diários Associados passaram a também nela predominar, ficando muito próximos de um monopólio. Entretanto, ainda havia um número razoável de concessionárias de radiodifusão que continuava a se esforçar por uma mudança das leis. Em 1953 foi apresentado no Senado outro anteprojeto de lei, também para a aprovação de um Código Brasileiro de Radiodifusão, que, após longas discussões, foi aprovado. Enviado à Câmara, novamente ocorreu longa demora e continuaram as discussões sobre o código. Com a atuação do EMFA, durante o governo Juscelino, tiveram início entendimentos, na maioria dos casos, de caráter pessoal, entre os setores de telecomunicações e de radiodifusão. Houve acordo de que a melhor solução para os dois setores era a unificação em um novo Código que regulasse tanto a parte de radiodifusão, quanto a das comunicações telefônicas e telegráficas, nos âmbitos estadual e municipal. A partir de 1957 passou a ter lugar uma ação mais ou menos conjunta, no Congresso Nacional, do pessoal de radiodifusão com o pessoal de telecomunicações. Nesse ano, o senador Cunha Mello apresentou um grande número de emendas ao projeto do senador Marcondes Filho, adaptando-o ao setor completo das telecomunicações. Ele passou a ser conhecido como “Substitutivo Cunha Mello para o Código Brasileiro de Telecomunicações”. Mais um grande número de emendas foi apresentado a esse projeto e ele foi aprovado no Senado e encaminhado à Câmara dos Deputados. Passaram-se mais quatro anos e novo substitutivo foi apresentado pelo deputado Nicolau Tuma, o qual foi aprovado pela Câmara, após receber mais noventa e nove emendas. Um fato que auxiliou a aceleração da aprovação do Código foi uma inesperada punição, aplicada por Jânio Quadros a Rádio Jornal do Brasil. Poucos meses após sua posse na Presidência da República, Jânio Quadros ficou contrariado com os termos de um programa irradiado por essa rádio. As poucas normas existentes davam ao Presidente da República o poder de aplicar punições a seu critério e Jânio aplicou a Rádio Jornal do Brasil uma suspensão de suas transmissões por dois dias. Esse fato avivou muito as preocupações do setor de
radiodifusão, porque era muito leve o teor do programa visado. O setor concentrou-se na idéia de que havia necessidade imperiosa de uma legislação completa e passou a se empenhar com maior interesse junto ao Congresso, conseguindo apressar a aprovação do projeto de lei. Retornando ao Senado, ele foi rapidamente aprovado. Levado ao presidente João Goulart, recebeu cinqüenta e dois vetos parciais, que modificavam inteiramente o espírito do projeto de lei, porém foi tão eficaz a ação conjunta dos setores de radiodifusão e de telecomunicações junto ao Congresso, que todos os vetos foram rejeitados. No dia 27 de agosto de 1962 foi sancionada a lei 4.117 – Código Brasileiro de Telecomunicações (CBT).
Características e Organização do Código Brasileiro de Telecomunicações
Os dois setores, radiodifusão e telecomunicações, ficaram muito satisfeitos com a sanção do Código Brasileiro de Telecomunicações. Ele criou vários fatores que permitiram, principalmente, a evolução progressiva de uma rede nacional de telecomunicações que atendesse efetivamente às necessidades do povo e da economia brasileiros, em todo o território nacional. Até então existia uma falta de políticas claras, de normas e regras operacionais, que resultassem em um sistema coerente e compatível entre as diferentes redes estaduais e locais. A falta anterior dessas regras resultou na instalação de inúmeros sistemas telefônicos, que utilizavam equipamentos de diferentes origens e também diferentes características. Como consequência, a sua interligação era muito difícil e de custos elevados.
O Código era constituído de treze capítulos e dois artigos como disposições finais:
- Capítulo I – Introdução – Em três artigos trata da área de abrangência e dos documentos
- Capítulo II – Das Definições – Em seis artigos define os diversos serviços e meios das telecomunicações
- Capítulo III – Da Competência da União – Em seis artigos, define a competência da União sobre a prestação de todos os serviços de telecomunicações e seu poder de fiscalização. Dentro de seus limites respectivos, os Estados e Municípios poderão organizar, regular e prestar serviços de telefonia, obedecidas as normas fixadas pelo Conselho Nacional de Telecomunicações.
- Capítulo IV – Do Conselho Nacional de Telecomunicações – Em dezesseis artigos, cria o Conselho Nacional de Telecomunicações – CONTEL, fixa sua competência, organização, composição, disposição geral sobre seu funcionamento e normas
- Capítulo V – Dos Serviços de Telecomunicações – Em vinte e um artigos define os diferentes tipos de serviços de telecomunicações, as normas gerais para sua concessão, fiscalização, vistoria e funcionamento. Autoriza o Governo Federal a constituir uma empresa, sob a forma de empresa pública, a fim de explorar industrialmente os serviços de telecomunicações postos sob o regime de exploração direta pela União. Fixa as normas básicas para seu funcionamento. Estabelece que as tarifas dos serviços públicos de telecomunicações serão fixadas pelo
- Capítulo VI – Do Fundo Nacional de Telecomunicações – Cria o Fundo Nacional de Telecomunicações, para financiar a empresa criada no capítulo
- Capítulo VII – Das Infrações e Penalidades – Define detalhadamente as infrações, seu julgamento e penalidades aplicáveis, para os serviços públicos, em especial a radiodifusão.
- Capítulo VIII – Das Taxas e Tarifas – O Conselho Nacional de Telecomunicações é o órgão responsável pela fixação de taxas e tarifas de todos os serviços de telecomunicações. Estabelece as normas gerais que serão seguidas pelo Contel nessa
- Disposições Gerais e Transitórias – Estabelece as regras a serem seguidas pelos diferentes órgãos públicos, na implementação do Código.
- Disposições Finais – Entrada em vigor do Código e revogação das disposições em contrário.
O Código Brasileiro de Telecomunicações sofreu modificações, merecendo destaque:
- Decreto-lei 162, de 13 de fevereiro de 1967 – Estabeleceu que, a partir de 15 de março de 1967, seria de competência exclusiva da União a exploração dos serviços de telecomunicações, diretamente ou através de autorizações ou concessões. A União substituiria automaticamente os Estados e Municípios, como Poder Concedente, em todos os serviços de telecomunicações até então sob sua jurisdição. Esse decreto-lei
corrigiu uma falha que existia até então: o Poder Concedente dos serviços de telecomunicações estava dividido entre União, Estados e Municípios, o que impedia a integração desses serviços. Era necessário que constituíssem um sistema compatível em nível nacional, o que era impossível de se obter sem a existência de uma regulação centralizada.
- Decreto-lei 235, de 28 de fevereiro de 1967 – Alterou o decreto-lei 162, autorizando o Contel a assinar convênios com governos estaduais para execução de fiscalização e controle de telecomunicações por meio de seus órgãos especializados.
- Decreto-lei 236, de 28 de fevereiro de 1967 – Foi elaborado e proposto pelo Plenário do Contel, com o propósito de esclarecer pontos duvidosos do Código. Na parte referente à radiodifusão, incluiu normas gerais para uma política de programações com cobertura nacional, ao mesmo tempo em que procurava evitar um possível monopólio da opinião pública. As diretrizes e restrições para a formação de cadeias nacionais de rádio e de televisão seguiram os mesmos princípios gerais vigentes nos Estados Unidos. Foi fixado, em seu artigo 12, um número máximo de concessões que podiam ser atribuídas a cada pessoa jurídica ou física. Havia a preocupação de evitar problemas como os que tinham ocorrido anteriormente, com a hegemonia dos Diários Associados. Como consequência dessa lei, foram constituídas várias cadeias de emissoras: Globo, SBT, Bandeirantes, Record, Rede TV!, CNT e outras. Há redes com maior audiência que outras, porém não existiu mais monopólio.
Efeitos do Código Brasileiro de Telecomunicações
A situação geral das telecomunicações brasileiras antes da aprovação do CBT apresentava, em princípio, problemas gerais que foram sanados em decorrência da regulação decorrente do Código. Os principais problemas e situações que sofreram correções ou modificações assim podem ser comentados:
- as tarifas telefônicas estavam abaixo da realidade, por problemas político-eleitorais das Câmaras Municipais. Essa dificuldade foi parcialmente solucionada com a aprovação do Código, quando todas as tarifas passaram a ser previamente aprovadas pelo
O decreto-lei 162, de 13 de fevereiro de 1967, resolveu completamente esse problema, ao passar para o Governo Federal a responsabilidade total sobre as telecomunicações. O forte inter-relacionamento entre as redes de telecomunicações de áreas e estados diferentes exige a unificação das normas e regras de operação, o que é facilitado pela simultânea unificação geral da gestão superior.
- as maiores concessionárias de serviços de telefonia, quase todas estrangeiras, devido às baixas tarifas não se interessavam mais pela prestação dos serviços e não investiam mais em suas redes, que não eram ampliadas. Ao término da concessão entregavam as instalações à Prefeitura, que era o Poder Concedente. Ao receber as instalações, a Prefeitura podia adotar uma das seguintes linhas de ação:
- Assumir a responsabilidade de prestação do serviço telefônico – Com esse objetivo, criava-se um órgão ou empresa municipal e tentava-se ampliar a rede telefônica para atender à demanda existente. Geralmente não havia experiência técnica, nem recursos financeiros suficientes para realizar as ampliações, ficando-se impotente frente às reclamações. Os serviços decresciam, com tendência a desaparecer, como ocorreu em várias
- Procurar um grupo de empresários locais, interessados na ampliação da rede telefônica – Eles formavam uma empresa, à qual era outorgada a concessão para o serviço telefônico. Se esses empresários dispusessem efetivamente de dinheiro e as tarifas fossem atualizadas, poderia haver resultado Se dependessem apenas do autofinanciamento, não tinham êxito, porque a obra teria de ser realizada de acordo com a entrada de recursos e, em conseqüência, seria muito demorada, o que fazia com que os futuros usuários perdessem a confiança nela e, com frequência, a obra não chegava ao término. Os serviços decresciam, com tendência a desaparecer.
- Assumir a responsabilidade de prestação do serviço telefônico – Posteriormente a Prefeitura aceitava a proposta, que com muita frequência era feita pela antiga concessionária, de assinar um contrato de administração, mediante uma quota mensal (normalmente de 12% da
renda mensal bruta). Essa ação foi adotada com muita frequência pela Companhia Telefônica Brasileira, principalmente no interior do Estado de São Paulo. Com esse procedimento ela garantia o recebimento de uma boa remuneração, que não tinha quando operava como concessionária, além de não ter responsabilidade pela expansão da rede, o que passara a caber à Prefeitura. Os investimentos para expansões de redes eram de total responsabilidade da Prefeitura.
- Quando ainda não existia um órgão regulador para a telefonia, os equipamentos eram comprados no exterior sem preocupação de verificar quais eram as suas características técnicas. Essas eram sempre as do país onde tinham sido fabricadas as centrais telefônicas. Por essa razão, quando foi iniciada a automatização, na década de 1920, houve dificuldade de interligação entre as diferentes redes do país. Esse problema foi sanado com a aprovação do CBT e a constituição do Contel, que estabeleceu as normas e regras que permitiram a introdução da discagem direta à distância – DDD. Até essa ocasião, era grande o número de redes telefônicas locais, geralmente em pequenas localidades, que não tinham nenhuma possibilidade de ligação externa.
- A baixa rentabilidade das prestadoras de serviços telefônicos fazia com que elas não dispusessem de crédito junto às instituições financeiras, o que ainda mais restringia sua capacidade de investir na expansão das redes telefônicas. O CBT criou o Fundo Nacional de Telecomunicações (FNT), alimentado por uma sobretarifa nas contas telefônicas, e uma empresa para executar os serviços interurbanos interestaduais e internacionais, a Empresa Brasileira de Telecomunicações – Embratel. O FNT foi inicialmente colocado à disposição da Embratel para a implantação dos equipamentos e redes necessários à prestação dos serviços sob sua Apesar da elevada demanda existente na telefonia local, essa decisão foi correta, porque a insuficiência de meios de longa distância mostrou ser muito mais presente. Com instalações de boa qualidade, operadas e geridas com eficiência, os tráfegos interestadual e o internacional cresceram com extrema rapidez, tornando-se a base principal da credibilidade financeira, que passou a existir em relação a todas as empresas que constituíam o Sistema Nacional de Telecomunicações. Com o crescimento da receita operacional total da Embratel, os recursos do FNT passaram a
ser aplicados na expansão das redes locais e intraestaduais, sem criar nenhum problema financeiro para a empresa.
- Até a aprovação do CBT, os serviços internacionais eram prestados somente por cinco empresas estrangeiras, sendo a telefonia efetuada via rádio e a telegrafia e o telex via rádio e cabo telegráfico submarino. De acordo com o Código, esses serviços eram de responsabilidade do Governo Federal, que poderia executá-los diretamente ou através de concessões. Quando o Brasil aderiu ao sistema de comunicações por satélites, manteve essa posição. Foram iniciados entendimentos com os concessionários internacionais para a constituição de uma empresa, da qual todos participariam, assim como a União. Houve muita confusão: cada um desejava ser o único ou principal operador e não houve acordo. Após a constituição da Embratel, o Contel analisou o problema e propôs ao Presidente da República que fosse atribuída somente a Embratel a responsabilidade de operação do terminal internacional para satélite. Considerava que era perigoso deixar as comunicações internacionais sob o controle de uma única empresa, ainda mais se ela era Após alguns debates, o Presidente da República Castello Branco optou pela solução de criar a Embratel. As concessionárias não se conformaram e tentaram, de todas as maneiras, atrapalhar a ação da Embratel, que fez um bom serviço e, em curto prazo, instalou o terminal internacional. As concessionárias recusaram-se a usá-lo, pretendendo continuar a operar via rádio. Poucos dias depois do início da operação da Embratel via satélite, todas suspenderam seus serviços por falta de usuários. Todos esses passaram a preferir as comunicações via satélite, porque eram de qualidade extremamente melhor, pelo mesmo preço. Para se ter idéia do que representou o serviço internacional para o sucesso da implantação do Sistema Nacional de Telecomunicações, vale lembrar que a receita bruta da Embratel, apenas proveniente dos serviços internacionais, ocorrida nos nove primeiros meses de operação do terminal internacional por satélite, foi igual ao custo total de construção e instalação desse terminal.
- Em cumprimento ao Código, o Contel foi constituído em 1963. Até 1967, com a criação do Ministério das Comunicações, que assumiu as responsabilidades do Contel, ele tinha elaborado e posto em vigor um grande número de normas e regras, anteriormente inexistentes, dentre as quais pode-se mencionar:
- Regulamento para aplicação do Código Brasileiro e Telecomunicações;
- Plano Nacional de Telecomunicações;
- Regulamento dos Serviços de Radiodifusão;
- Regulamento dos Serviços de Telefonia;
- Plano de frequências de radiodifusão em onda média;
- Normas para o Serviço Interior Limitado;
- Tarifas para o Serviço Telegráfico Público Interior;
- Normas sobre tarifas de telecomunicações;
- Prioridades e diretrizes para a implantação do Sistema Nacional de Telecomunicações pela Embratel;
- Instalação de redes privadas telex;
- Instalação de estações de radiodifusão;
- Instalação de estações de televisão;
- Normas para estações de retransmissão de televisão;
- Reserva de canais para televisão educativa;
- Normas para o serviço de contabilidade das empresas telefônicas;
- Normas padrão para os contratos de concessão de serviços de telecomunicações;
- Diretrizes para o uso de autofinanciamento nas expansões de telefonia.
Considerações Finais
O Código Brasileiro de Telecomunicações vige até hoje, tendo sofrido várias modificações, o que é absolutamente correto, pois é necessário que se corrijam os caminhos que estão sendo percorridos, sempre que as circunstâncias aconselharem modificações. Não se deve ficar preso a idéias ou ideologias gerais. Um caso típico ocorreu no setor de telecomunicações. O Código previa que os serviços seriam prestados diretamente ou através de concessões. Na política inicialmente seguida em 1964, foi dada preferência às concessões. Mesmo após a aprovação do Código e emissão de regras e normas pelo Contel, os concessionários existentes declararam-se desinteressados na continuação da prestação dos serviços. Foi aberta a possibilidade de serem outorgadas novas concessões, porém os possíveis candidatos sempre deixaram claro que os investimentos teriam de ser totalmente custeados pelo Governo. Foi, então, tomada a decisão de
prestação direta dos serviços interurbanos pela Embratel, a qual foi posteriormente complementada com a constituição da Telebrás. A política foi ampliada, com um forte apoio à indústria e ao empresariado nacional – tudo dentro dos termos do Código. Bons resultados foram sendo obtidos, com uma estrutura operacional estatal montada em termos de eficiência e capacitação para o preenchimento dos cargos de direção.
Entre 1982 e1985, essa situação foi sendo modificada, com a crescente politização na indicação de pessoal para esses cargos. Esse fato foi crescendo continuamente e passou a se notar certa queda no crescimento do sistema de telecomunicações, coincidentemente com alguma estagnação ou até queda na qualidade dos serviços. Infelizmente crescia o número de dirigentes que assumiam seus cargos, não devido à sua qualificação, porém apenas por interesses políticos e eleitoreiros. Dentro do próprio setor foi crescendo a reação a essa situação e, em 1998, foi consumada a mudança de política do setor, com a sua privatização.
Nesse meio tempo, ainda houve uma tentativa mais drástica e infeliz. A Constituição Federal de 1988 declarou a estatização completa do setor no seu artigo 21:
“Compete à União: (…)
- – manter o serviço postal e o correio aéreo nacional;
- – explorar diretamente ou mediante concessão ou permissão a empresas sob controle acionário estatal, os serviços telefônicos, telegráficos, de transmissão de dados e demais serviços públicos de telecomunicações, assegurada a prestação de serviços de informações por entidades de direito privado através da rede pública de telecomunicações explorada pela União;
- – explorar diretamente ou mediante autorização, concessão ou permissão: a) os serviços de radiodifusão sonora, de sons e imagens e os demais serviços de telecomunicações.”
Essa estatização não chegou a ser implementada e o sistema de telecomunicações foi privatizado, sendo regulado pela Lei Geral das Telecomunicações (nº 9.472), de 16 de julho de 1.997.