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CÓDIGO ADUANEIRO DO MERCOSUL

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CÓDIGO ADUANEIRO DO MERCOSUL

AVANÇOS E IMPACTOS PARA O BRASIL

 

 

 

CÓDIGO ADUANEIRO DO MERCOSUL

AVANÇOS E IMPACTOS PARA O BRASIL

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

CONFEDERAÇÃO NACIONAL DA INDÚSTRIA – CNI

Robson Braga de Andrade

Presidente

 

Diretoria de Desenvolvimento Industrial

Carlos Eduardo Abijaodi

Diretor

 

Diretoria de Relações Institucionais Mônica Messenberg Guimarães Diretora

 

Diretoria de Serviços Corporativos

Fernando Augusto Trivellato

Diretor

 

Diretoria Jurídica

Hélio José Ferreira Rocha

Diretor

 

Diretoria de Comunicação Ana Maria Curado Matta Diretora

 

Diretoria de Educação e Tecnologia Rafael Esmeraldo Lucchesi Ramacciotti Diretor

 

Diretoria de Inovação Gianna Cardoso Sagazio Diretora

 

CÓDIGO ADUANEIRO DO MERCOSUL

AVANÇOS E IMPACTOS PARA O BRASIL

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Brasília, 2019

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

© 2019. CNI – Confederação Nacional da Indústria

Qualquer parte desta obra poderá ser reproduzida, desde que citada a fonte.

 

 

CNI

Gerência Executiva de Assuntos Internacionais

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

FICHA CATALOGRÁFICA

 

 

C748c

 

Confederação Nacional da Indústria.

Código aduaneiro do Mercosul : avanços e impactos para o Brasil /

 

Confederação Nacional da Indústria. – Brasília : CNI, 2019.

71 p. : il.

 

  1. 1. Mercosul. 2. Comércio Internacional. I. Título.

 

 

 

CDU: XXX

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

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Confederação Nacional da Indústria

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LISTA DE TABELA

 

 

 

 

 

TABELA 1 – PRINCIPAIS DESTAQUES DA ESTRUTURA DO CAM…………………… 24

 

 

 

 

 

 

 

QUADRO 1 – ESTRUTURA ORGANIZACIONAL DO MERCOSUL………………………………………………………………………………………………… 17

QUADRO 2 – ESTRUTURA DO CÓDIGO ADUANEIRO DO MERCOSUL (CAM)………. 23

QUADRO 3 – CLASSIFICAÇÃO DE REGIMES ADUANEIROS NO CAM……………….. 30

QUADRO 4 – COMPARAÇÃO ENTRE CONCEITOS DE REGIME ADUANEIRO………… 34

QUADRO 5 – INTERNALIZAÇÃO DO CAM PELOS ESTADOS-PARTES DO MERCOSUL 45

QUADRO 6 – COMPARAÇÃO ENTRE O CAM E O AFC………………………………….. 56

QUADRO 7 – NORMAS RELATIVAS À TRANSPARÊNCIA NO AFC…………………….. 69

 

 

 

 

 

 

GRÁFICO 1 – INDICADORES DE FACILITAÇÃO OCDE………………………………………………………………………………………………… 70

GRÁFICO 2 – INDICADORES DE FACILITAÇÃO (WEF)……………………………….. 71

 

 

 

 

 

SUMÁRIO EXECUTIVO………………………………………………………………………………….. 9

DE FACILITAÇÃO DO COMÉRCIO DA OMC…………………………………………………. 47

ANEXO A – NORMAS RELATIVAS À TRANSPARÊNCIA NO AFC………………………. 69

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Assinado em 2010, o Código Aduaneiro do Mercosul busca

harmonizar a legislação aduaneira dos Estados Membros, facilitar e promover o comércio intra e extrabloco

 

 

 

SUMÁRIO EXECUTIVO

 

 

 

 

 

 

SUMÁRIO EXECUTIVO

 

 

 

 

 

O presente estudo busca apresentar os principais objetivos, inovações e previsões do Código Aduaneiro do Mercosul (CAM) e mapear os principais impactos que a sua implementação trará para o Brasil.

Assinado em 2010, o CAM busca harmonizar a legislação adua- neira dos Estados Membros, facilitar e promover o comér- cio intra e extrabloco. Sua adoção é positiva à medida que padroniza critérios e conceitos para os regimes aduaneiros, favorece a transparência de regras, possibilita os tratamentos mais previsíveis e permite melhor planejamento por parte das empresas, contribuindo para facilitar e promover o comércio.

O Brasil está em vias de ratificar o CAM depois de obter a aprovação no Congresso Nacional em 2018, mas aguarda a sanção e promulgação pela Presidência da República. Assim que for ratificado por todos os membros, cada país do Mercado Comum do Sul (Mercosul) não apenas deverá respeitar as normas do Código, mas também adequar as legislações de acordo com suas disposições. Paraguai e Uruguai encontram-se em processo de ratificação e apenas a Argentina já ratificou o Código.

Um aspecto que o Brasil terá que rever com a implementação do CAM diz respeito à impossibilidade de adição de valores referentes à capatazia à base de cálculo de tributos que tenham como fato gerador a entrada de mercadoria no território adua- neiro, o que é atualmente realizado pela aduana brasileira, mas expressamente proibido pelo Código. Outro tópico relevante e que confronta a prática brasileira refere-se ao conceito dos regimes aduaneiros especiais – questão sensível e que poderá afetar diretamente o modelo de funcionamento atual do comércio exterior brasileiro.

 

 

 

 

CÓDIGO ADUANEIRO DO MERCOSUL: AVANÇOS E IMPACTOS PARA O BRASIL

 

 

 

 

 

 

 

 

Nesse sentido, este estudo busca analisar os seguintes pontos:

 

São apresentadas informações gerais sobre o CAM e quais seus impactos. Esclarece-se, assim, o histórico e os objetivos do Código, indicando quais questões ele pretende endereçar e para quais fins ele foi designado.

Em seguida, é exposta a estrutura e os principais dispositivos do CAM. Com isso, busca-se mostrar as obrigações cen- trais que devem ser respeitadas e adotadas pelos Estados Membros. Por fim, é identificado o atual status do processo de ratificação e implementação do CAM em cada um dos Estados Membros.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

A adoção do CAM é positiva à medida que padroniza critérios e conceitos para os regimes aduaneiros, favorece a transparência de regras, possibilita os tratamentos mais previsíveis e permite melhor planejamento

por parte das empresas, contribuindo para facilitar e promover o comércio

Após essa parte explicativa, é feita uma relação entre o CAM e o Acordo de Facilitação de Comércio (AFC) da Organização Mundial do Comércio (OMC), tendo em vista que todos os Estados Membros do Mercosul são também signatários do AFC e devem, assim, cumprir, de forma harmônica, com as disposições de ambos os acordos.

Por fim, são analisados quais os impactos que o CAM traz para o Brasil, de forma a identificar as principais adapta- ções necessárias na legislação brasileira, bem como quais vantagens ele pode trazer para o comércio exterior do Brasil na região.

Com base nessa análise, pode-se concluir que o CAM repre- senta uma oportunidade ao desenvolvimento e à organiza- ção da legislação aduaneira no Mercosul e, especialmente, no Brasil, mesmo endereçando conceitos genéricos e sem instruções concretas de como as diretrizes colocadas devem ser implementadas.

 

 

 

 

SUMÁRIO EXECUTIVO

 

 

 

 

 

 

 

Em razão disso, verifica-se oportunidade para que os paí- ses do bloco aproveitem outros acordos internacionais e multilaterais sobre o tema – como o Acordo de Facilitação do Comércio e a Convenção de Quioto Revisada – para paralelamente estabelecerem regras, obrigações e normas de modernização em termos aduaneiros.

Dessa forma, o estudo traz as seguintes recomendações ao governo brasileiro para melhor aproveitamento das possibilidades trazidas pelo CAM:

 

  • O Brasil deve mapear os pontos de sua legislação que estão em dissonância com o CAM e rever a estrutura normativa do regulamento aduaneiro para que esteja tanto de acordo com os interesses do país quanto em convergência com as regras do Código.
  • O Brasil deve empreender melhores esforços para logo expedir normas complementares e regulamen- tares que operacionalizem e preencham as lacunas do CAM, de modo a garantir que não ocorram retro- cessos dos compromissos internacionais assumidos pelo país na agenda de facilitação de comércio.
  • O Brasil deve permitir e promover a interação com o setor privado no Comitê Aduaneiro do Mercosul que será
  • O Brasil deve aproveitar a oportunidade trazida pelo CAM para assumir uma posição de liderança na política aduaneira do Mercosul e na negociação de um protocolo adicional mais ambicioso em termos de facilitação de comércio dentro do

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

O CAM representa uma oportunidade ao desenvolvimento e à

organização da legislação aduaneira no Mercosul e, especialmente, no Brasil

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Desde 1994 começou a ser discutido o texto de um Código Aduaneiro que foi concluído apenas em 2010. O longo processo se deu pela falta de consenso entre os governos, ora por questões técnicas ora por razões eminentemente políticas

 

 

 

1 INTRODUÇÃO

 

 

 

 

 

 

1 INTRODUÇÃO

 

O Mercado Comum do Sul (Mercosul)1 visa à integração comer- cial dos membros do bloco com a livre circulação de bens, serviços e pessoas, o estabelecimento de uma tarifa externa comum2, a coordenação e a harmonização das legislações internas dos Estados Partes nas áreas relevantes3.

Nesse contexto, a criação de um Código Aduaneiro comum ganha importância, uma vez que proporciona a harmonização da legislação aduaneira, que, por sua vez, facilita a livre circulação de mercadorias e o comércio com terceiros Estados.

Desde 1994, ano em que o Mercosul passou a operar, começou a ser discutido o texto de um Código Aduaneiro que, como será visto a seguir, foi concluído apenas em 2010. O longo processo de conclusão e aprovação do Código se deve à existência de duas tentativas que fracassaram – ambas descartadas pela falta de consenso entre os governos, sendo que na primeira as divergências foram atribuídas à impossibilidade para decidir sobre conceitos técnicos-chave e, na segunda, por razões eminentemente políticas.

 

 

  • O Mercosul é “um processo de integração regional conformado inicialmente pela Argentina, Brasil, Paraguai e Uruguai, ao qual recentemente incorporaram-se a Venezuela e a Bolívia, esta última em processo de adesão. […] Desde sua criação, teve como objetivo principal propiciar um espaço comum que gerasse oportunidades comerciais e de investimentos mediante a integração competitiva das economias nacionais ao mercado internacional”. Cabe ressaltar que a Venezuela, atualmente, encontra-se suspensa de todos os direitos e obrigações inerentes à sua condição de Estado Parte. Disponível em: https://www.mercosur.int/pt-br/quem-somos/ em-poucas-palavras/. Acesso em: 10 2019.
  • A União Aduaneira consiste   na   “substituição de dois ou mais territórios aduaneiros por um único território aduaneiro, de tal forma que os direitos aduaneiros e demais regulamentações restritivas são eliminados quanto ao essencial dos intercâmbios comerciais entre os territórios constitutivos da união ou pelo menos no concernente ao essencial dos intercâmbios comerciais dos produtos originários desses territórios. Cada um dos membros da União aplica ao comércio com os territórios que não estejam compreendidos nela direitos aduaneiros e demais regulamentações do comércio que, em substância, sejam idênticos”. Disponível em: http://www.aladi.org/nsfaladi/vbasico.nsf/ vbusquedap/95D07ACF0E995678032568CD00447D81. Acesso em: 10 maio
  • Esses objetivos estão previstos na página principal do Mercosul. Disponível em: https://w mercosur.int/institucional/objetivos-del-mercosur/. Acesso em: 1 mar. 2019.

 

 

 

 

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A escolha pela codificação de normas traz consigo a visão unificadora e sistematizadora de consolidação das regras relevantes sobre determinada matéria em um único documento. Normalmente, os códigos não se propõem a responder todas as perguntas de determinado segmento da sociedade e/ou descrever exaustivamente todas as situações concretas possíveis. Enquanto instrumento de regulamentação, o Código busca fornecer uma moldura relevante para determinada matéria, servindo de guia para as atividades governamentais e privadas no desenvolvi- mento de atividade ou setor a partir da designação de regras gerais, conceitos e princípios.

Nesse contexto, o Código Aduaneiro do Mercosul (CAM) foi elaborado com o intuito de guiar os países do bloco a partir de regras e diretrizes comuns que permitam a apro- ximação e compatibilização de suas estruturas jurídicas e administrativas relativas ao controle e à administração de fronteiras, fazendo que seja possível atingir o pleno status de união aduaneira.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

O CAM busca traçar conceitos comuns e regras gerais a serem aplicadas uniformemente entre

os Membros do bloco, sem que isso implique a exclusão das competências internas das autoridades aduaneiras e/ou a substituição do

legislador nacional

Na prática, o CAM busca traçar conceitos comuns e regras gerais a serem aplicadas uniformemente entre os Membros do bloco, sem que isso implique a exclusão das competências internas das autoridades aduaneiras e/ou a substituição do legislador nacional. Pelo contrário, as aduanas e o processo legislativo de cada um dos Estados Partes continuam sendo de fundamental importância. Todavia, para que o bloco avance, o CAM propõe definições e diretrizes de como as atividades normativas e de administração das fronteiras devem ser realizadas.

Como se verá ao longo do estudo, a incorporação do CAM ainda requer tempo e adaptações na estrutura normativa dos Estados Partes – ainda que alguns já estejam mais avançados nesse processo, como é o caso do Uruguai –, mas sua importância e potenciais ganhos indicam que há muitos pontos positivos em sua implementação.

No caso do Brasil, além da necessidade de que o CAM conclua o processo de ratificação em curso, será necessário

 

 

 

 

1 INTRODUÇÃO

 

 

 

 

 

 

 

realizar ajustes na estrutura das normas aduaneiras. Diferente dos demais Membros do Mercosul que possuem um código aduaneiro interno com as normas de maior hierarquia e relevância, no Brasil, apesar do Regulamento Aduaneiro4, a legislação é descentralizada e o poder decisório encontra-se distribuído sob a competência de múltiplas autoridades.

A consequência de tal descentralização é a existência de normas em excesso, produzidas por diversos meios – tais como: decretos, portarias, instruções normativas, resoluções, etc. – e que nem sempre são compatíveis entre si, dificultando a compreensão das regras aplicáveis pelas empresas e a devida atualização e aplicação pelas autoridades. Por tal motivo, o CAM não apenas se apresenta como um instrumento de avanço do Mercosul, mas também como uma oportunidade para o Brasil reduzir e consolidar suas normas aduaneiras principais, de forma a trazer maior clareza, previsibilidade e segurança jurídica aos seus operadores de comércio exterior.

O estudo também explora o fato de que a adoção do CAM deve implicar o abandono de alguns instrumentos e práticas atualmente adotadas no Brasil, como, por exemplo, o espaço dos regimes aduaneiros especiais para setores específicos, bem como situações e conceitos relativos à tributação na importação.

Ao considerar que o CAM é um instrumento jurídico pouco explorado pela literatura especializada e pouco conhecido pelo setor privado, o presente estudo visa oferecer uma visão geral sobre o tema a partir de breve exposição sobre seu histórico de criação e objetivos, bem como de sua estrutura e principais dispositivos; da avaliação de sua compatibilidade com as regras de facilitação de comércio da OMC; da apresentação do processo de ratificação e implementação dos Estados Partes para que o Código entre em vigor e da análise dos impactos que o CAM trará ao Brasil. Ao final, são ainda apresentadas recomendações e conclusões sobre o tema.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

As decisões relativas à elaboração de um código aduaneiro no Mercosul cabem ao Conselho do Mercado Comum (CMC) e ao Grupo de Mercado Comum (GMC)

 

 

 

2 HISTÓRICO E   OBJETIVOS DO CAM

 

 

 

 

 

 

2 HISTÓRICO E OBJETIVOS DO CAM

As decisões no Mercosul são tomadas por três órgãos: (i) o Conselho de Mercado Comum (CMC); (ii) o Grupo de Mercado Comum (GMC); e (iii) a Comissão de Comércio do Mercosul (CCM). O quadro a seguir apresenta, de forma esquematizada, essa estrutura:

 

QUADRO 1 – Estrutura Organizacional do Mercosul

 

Fonte: GMC.

 

 

 

Observam-se acima as decisões relativas à elaboração de um código aduaneiro que cabem ao CMC e ao GMC.

A primeira iniciativa para criação do Código surgiu em 16 de dezembro de 1994, quando foi criado e aprovado (mediante assinatura) o primeiro código aduaneiro pela Decisão do CMC do Mercosul nº 255.

 

 

5 Decisão CMC nº 25. Disponível em: http://www.sice.oas.org/trade/mrcsrs/decisions/ dec2594Textp.asp. Acesso em: 14 nov. 2018.

 

 

 

 

CÓDIGO ADUANEIRO DO MERCOSUL: AVANÇOS E IMPACTOS PARA O BRASIL

 

 

 

 

 

 

 

 

A finalidade do Código de 1994 era adotar uma legislação aduaneira comum6. Na decisão CMC nº 25, os Estados Partes reconheceram que, diante da entrada em vigor de uma União Aduaneira em 1995, era imprescindível que se adotassem normas comuns que permitissem a operacionalização da mesma, sendo estas reunidas em um Código Aduaneiro Comum7.

Após assinado, o Código de 1994 deveria ter entrado em vigor em até 30 (trinta) dias após a ratificação de, pelo menos, 2 (dois) Estados Partes. Isso, contudo, nunca ocor- reu, uma vez que apenas o Paraguai ratificou o acordo. A principal crítica a esse primeiro Código – e que impediu sua ratificação pelos demais países – foi o fato de ter sido criado muito apressadamente e não ter endereçado assun- tos essenciais aos Estados Partes8.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

A primeira iniciativa para criação do Código, de 1994, resultou no Anteprojeto de Código Aduaneiro, em 2000, mas não chegou a

ser assinado por divergências políticas sobre temas sensíveis em que interesses dos países

eram divergentes

Diante disso, o Comitê Técnico nº 2 do Mercosul, que trata sobre assuntos aduaneiros, passou a discutir uma revisão do Código de 1994. O objetivo era elaborar um Protocolo Adicional ao Código Aduaneiro de 1994. O processo de revisão ocorreu entre 1997 e 2000. Como resultado final, foi criado, em 2000, o Anteprojeto de Código Aduaneiro (ACAM), o qual não chegou a ser assinado pelos Estados Partes do Mercosul.

De acordo com representantes brasileiros presentes nas negociações à época e que foram entrevistados para o presente estudo, o problema desta vez teria sido devido a divergências políticas entre os países. Isso porque o ACAM foi elaborado apenas por técnicos das Aduanas dos Esta- dos Partes, abrangendo uma grande variedade de temas e incluindo pontos sensíveis em que interesses dos países eram divergentes, tais como: infrações e penalidades, regras tributárias para exportação, obrigatoriedade do

 

 

 

  • Em conformidade com o objetivo de harmonização das normas previsto no 1º do Tratado de Assunção. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/ decreto/1990-1994/D0350.htm. Acesso em: 10 maio 2019.
  • Preâmbulo da Decisão CMC nº 25/2006.
  • OLIVEIRA, Jonnathan Augusto Pinho de; OLIVEIRA, Maria Fátima Pinho de. Breves consideraciones sobre el código aduanero del MERCOSUR (CAM): Fuentes y antecedentes de creación. Ciencia e Interculturalidad, 20, n. 1, p. 32-41.

 

 

 

 

2 HISTÓRICO E OBJETIVOS DO CAM

 

 

 

 

 

 

 

uso de despachantes aduaneiros e a noção de território para fins do âmbito de aplicação do Código.

Em 2003, iniciou-se a terceira tentativa para criação de um Código Aduaneiro. A Decisão CMC nº 26 de 20039, que aprovou o programa de trabalho do Mercosul de 2004 a 2006, previu como um dos objetivos para esse período a identificação dos “aspectos conceituais básicos do Código Aduaneiro do Mercosul que requerem definições por parte do GMC”10.

A partir desses aspectos conceituais básicos, em 2006, foram estabelecidas as diretrizes para redação do novo projeto de Código Aduaneiro e foi criado pelo CMC um grupo especial de trabalho para elaboração do referido projeto11. Também foi estabelecido que o projeto do CAM deveria ser finalizado e levado à análise do GMC no primeiro semestre de 2007, prazo prorrogado até a primeira reunião ordinária do CMC de 200812.

 

Na reunião do CMC realizada em junho de 2008, os Estados Partes declararam a intenção de concluir as negociações do Código Aduaneiro do Mercosul durante a presidência pro tempore do Brasil no Mercosul, prevista para se encerrar em dezembro de 2008.

Apesar disso, o texto do CAM foi concluído e aprovado apenas em 2010, durante a XXXIX reunião do CMC, realizada em San Juan, Argentina, em 2 de agosto de 201013.

O que se verifica é que o CAM, de modo geral, conserva grande parte dos dispositivos criados pelo ACAM de 2000, trazendo algumas inovações – que serão discutidas

Em 2003, iniciou-se a terceira tentativa para criação de um Código Aduaneiro. Com as diretrizes para redação do novo Código e a criação de um

grupo de trabalho especial com esse objetivo, em 2006, foi possível concluir e aprovar o CAM em 2010

 

 

 

  • Decisão CMC nº 26/2003. Disponível em: http://www.sice.oas.org/trade/mrcsrs/decisions/ asp. Acesso em: 10 maio 2019.
  • Resolução do Grupo do Mercado Comum do Mercosul (GMC) nº 40/06. Disponível em: http:// mercosur.int/SAM%5CGestDoc%5Cpubweb.nsf/5F6B83A11F29C88F032583F600687589/

$File/RES_040-2006_PT_CodigoAduanero.pdf. Acesso em: 10 maio 2019.

  • Decisão CMC nº 25/2006. Disponível em: http://www.sice.oas.org/Trade/MRCSRS/ Decisions/dec2506p.pdf. Acesso em: 19 2018.
  • Decisão CMC nº 55/2007. Disponível em: https://normas.mercosur.int/simfiles/normativas/ DEC_055-2007_PT_C%C3%B3digoAduaneiroMCS.pdf. Acesso em: 21 2018.
  • Decisão CMC nº 27/2010. Disponível em: http://www.aduana.gov.py/uploads/archivos/ DEC_027-2010_ES_CAN.pdf. Acesso em: 19 2018.

 

 

 

 

CÓDIGO ADUANEIRO DO MERCOSUL: AVANÇOS E IMPACTOS PARA O BRASIL

 

 

 

 

 

 

 

 

adiante – e, principalmente, eliminando disposições que foram alvo de divergências políticas entre os signatários.

A linha do tempo a seguir resume o processo de elaboração do CAM de 2010 a partir de seus principais marcos:

 

 

 

Início do processo de revisão do Código de 1994

 

Início da elaboração do novo projeto de Código Aduaneiro

 

Conclusão e aprovação do CAM 2010

Uruguai publica novo Código Aduaneiro interno adotando premissas do CAM

 

 

 

1994

2000

2006

2012

2018

 

 

 

 

1997

2003

2010

2012

 

 

 

Aprovação do Primeiro Código Aduaneiro (ratificado apenas pelo Paraguai)

Criação do Anteprojeto de Código Aduaneiro de 2000 (não foi assinado pelos Estados Partes)

Criação de um grupo especial de trabalho para elaboração do novo Código

Argentina ratifica o CAM

Congresso brasileiro aprova o CAM e encaminha para sanção e promulgação da Presidência da República

 

 

Conforme o texto aprovado em 2010, em seu preâmbulo, o CAM possui três objetivos principais:

 

  • Harmonizar as legislações dos Estados Partes: a harmonização da legislação, essencial para a constituição e promoção de um mercado comum14, já estava prevista no artigo 1º do Tratado de Assunção, que criou o Mercosul, em que os Estados Partes comprometeram-se a harmonizar suas legislações nas áreas pertinentes (como é o caso da área aduaneira) para fortalecer o processo de integração.
  • Eliminar a dupla cobrança da Tarifa Externa Comum (TEC) e a distribuição da renda aduaneira: a dupla cobrança da TEC é uma das barreiras tarifárias enfrentadas atualmente pelo Mercosul e que prejudica a livre circulação de mercadorias15. Sua eliminação é, portanto, essencial para que o Mercosul possa cumprir com sua finalidade como Mercado Comum.
  • Aprofundar o processo de integração do Mercosul: a adoção de uma legislação aduaneira em comum é uma das medidas centrais para o aprofundamento do processo de integração do

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Apesar de alguns dos termos estabelecidos pelo CAM parecerem “simples”, é importante lembrar que, anteriormente ao Código, não havia definições para tais conceitos no Brasil

 

 

 

3 ESTRUTURA E PRINCIPAIS DISPOSITIVOS

 

 

 

 

 

 

3 ESTRUTURA E PRINCIPAIS DISPOSITIVOS

O CAM é formado por um texto legal extenso e detalhado, composto de 181 artigos, organizados em 14 títulos, segundo a estrutura a seguir:

 

QUADRO 2 – Estrutura do Código Aduaneiro do Mercosul (CAM)

Fonte: CAM.

 

 

 

 

CÓDIGO ADUANEIRO DO MERCOSUL: AVANÇOS E IMPACTOS PARA O BRASIL

 

 

 

 

 

 

 

 

A tabela a seguir traz alguns destaques a respeito dos principais títulos.

 

TABELA 1 – Principais destaques da estrutura do CAM

 

TÍTULO Destaques/observações
 

TÍTULO I –

Disposições Preliminares e Básicas

É disciplinado o âmbito de aplicação do CAM, definido como a totalidade do território dos Estados Partes do Mercosul e são apresentados conceitos e definições importantes não só para a interpretação e aplicação das normas do CAM, mas para a devida gestão de todas as atividades aduaneiras do bloco.
 

 

 

TÍTULO II –

Sujeitos Aduaneiros

São definidos os sujeitos aduaneiros, quais sejam: a administração aduaneira – composta pelos órgãos nacionais competentes para aplicar a legislação aduaneira16 – e as pessoas vinculadas à atividade aduaneira – que realizam atividades vinculadas a destinos e operações aduaneiros17, como importador, exportador, despachante aduaneiro, transportador, depositário, agente de carga, entre outros. Além de definir os sujeitos, as disposições contidas neste título também versam sobre os direitos e deveres dos mesmos na esfera aduaneira no contexto do Mercosul.
TÍTULO III –

Ingresso da Mercadoria no Território Aduaneiro

 

Disciplina o ingresso de mercadorias no território aduaneiro do Mercosul.

TÍTULO IV –

Destinos Aduaneiros de Importação

 

Trata de aspectos diversos da importação, sendo um dos títulos mais relevantes do CAM e que concentra a maior parte dos dispositivos do código.

 

TÍTULO VII –

Trânsito Aduaneiro

Dispõe sobre as regras de trânsito aduaneiro, tratando dos casos e regras para que mercadorias circulem pelo território aduaneiro do Mercosul, de uma Aduana de partida a outra de destino, sem o pagamento de tributos aduaneiros ou aplicação de restrições de caráter econômico, tanto na importação quanto na exportação.
 

 

TÍTULO VIII –

Regimes Aduaneiros Especiais

Trata sobre os regimes aduaneiros especiais, os quais permitem o ingresso, a circulação e a saída de mercadorias do território aduaneiro do bloco com redução ou isenção do pagamento de tributos, bem como a simplificação do despacho aduaneiro. Além de tratar-se de ponto relevante aos operadores do comércio exterior que se encontram nos Estados Partes, o ponto merece especial atenção, pois o CAM adotou conceitos e delimitações diferentes dos que são atualmente adotados pelo Brasil, sendo

ponto que demandará mudanças no sistema jurídico nacional para fins de implementação.

 

 

 

 

 

  • 7º do CAM.
  • 14 do CAM.

 

 

 

 

3 ESTRUTURA E PRINCIPAIS DISPOSITIVOS

 

 

 

 

 

 

 

TÍTULO Destaques/observações
 

TÍTULO X –

Disposições Comuns à Importação e à Exportação

 

Disciplina diretrizes sobre questões comuns à importação e à exportação como proibições e restrições, garantia, gestão de risco, utilização de sistemas informatizados, entre outras questões de ordem gerencial e operacional das Aduanas.

 

TÍTULO XI –

Tributos Aduaneiros

 

Dispõe sobre tributos aduaneiros trazendo diretrizes, conceitos e regras de operacionalização diversos dos que estão atualmente vigentes no Brasil.

Fonte: CNI, 2019. Elaboração do Autor.

 

 

 

Nesse contexto, passam-se a abordar algumas definições básicas trazidas pelo CAM e que são de extrema importância para compreensão das regras trazidas pelo Código e seu impacto sobre o sistema jurídico brasileiro para, em seguida, tratar das questões mais importantes de cada um dos títulos, conforme ressaltou-se anteriormente.

 

 

  • DEFINIÇÕES BÁSICAS

 

O CAM traz definições de conceitos básicos do comércio exterior18, o que é de grande importância para promover a harmonização desses termos no bloco, bem como facilitar o dia a dia das operações.

Apesar de alguns dos termos estabelecidos pelo CAM parecerem “simples”, é importante lembrar que, anteriormente ao Código, não havia definições para tais conceitos no Brasil.

A extensão de conceitos internos para operações de comércio exterior nem sempre é adequada. Operações de comércio exterior necessariamente envolvem ao menos dois países distintos, com legislações internas diferentes. Assim, a utilização de critérios e termos diferentes por cada país envolvido na operação pode trazer interpretações distintas e dificuldades nas operações.

Um exemplo dos potenciais problemas da falta de conceitos harmonizados é a própria noção de importação. Ainda que seja pacífico entre os países que a importação se relaciona com a entrada de mercadorias estrangeiras no território aduaneiro, até então, a forma com que cada Estado interpreta a natureza dessa operação e seus desdobramentos é relevante para determinar em que casos haverá a incidência de tributos e como ocorrerá sua cobrança.

 

 

  • 3º do CAM.

 

 

 

 

CÓDIGO ADUANEIRO DO MERCOSUL: AVANÇOS E IMPACTOS PARA O BRASIL

 

 

 

 

 

 

 

 

No caso do Brasil, por exemplo, por um lado, a legislação vigente determina que, via de regra, o Imposto de Importação (II) incide sobre a entrada de mercadorias no país19, inde- pendentemente de seu uso ou finalidade. Por outro lado, o CAM propõe que o imposto seja cobrado somente na importação definitiva20, ou seja, quando houver a intenção de que a mercadoria permaneça no território aduaneiro do bloco.

A dificuldade em se compreender as regras aplicáveis acaba prejudicando o ambiente de negócios do país e desencorajando investimentos e trocas internacionais. No Anexo 1, é possível verificar a importância da transparência das normas reguladoras do comércio exterior destacadas no Acordo de Facilitação de Comércio (AFC) da Organização Mundial do Comércio (OMC), considerando também os indicadores de desempenho em termos de facilitação de comércio divulgados pela Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) e pelo Fórum Econômico Mundial (WEF, na sigla em inglês).

Diante disso, destacam-se a seguir as definições consideradas como mais relevantes trazidas pelo CAM em seu artigo 3º:

  1. Conceitos de importação e exportação

No CAM, importação é conceituada como a entrada de mercadoria no território aduaneiro do Mercosul. Da mesma forma, exportação é definida como a saída de mercadoria do território aduaneiro do bloco.

Deve-se chamar atenção aqui para o fato gerador. Este é o caso, por exemplo, para aplicação no Brasil, do Imposto de Importação (II), do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) e do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) na importação. Nesse sentido, tendo em vista que o Regulamento Aduaneiro Brasileiro21 não apresenta, de forma clara e direta, o conceito de importação, a definição trazida pelo CAM é de grande importância para evitar interpretações conflitantes e guiar a atuação das autoridades nas fronteiras.

  1. Conceito de liberação

O CAM não traz o termo “desembaraço”, como o faz a legislação brasileira. Em vez disso, utiliza o termo “liberação”. De acordo com o CAM, liberação é o “ato pelo qual a Administração Aduaneira autoriza o declarante ou quem tiver a disponibilidade jurídica da mercadoria a dela dispor para os fins previstos no regime aduaneiro autorizado, após o cumprimento das formalidades aduaneiras exigíveis”.

 

 

 

  • 69 do Regulamento Aduaneiro (Decreto nº 6.759/2009) e art. 19 do Código Tributário Nacional (CTN). 20 Art. 157 do CAM.
  • Decreto nº 759 de 5 de fevereiro de 2009.

 

 

 

 

3 ESTRUTURA E PRINCIPAIS DISPOSITIVOS

 

 

 

 

 

 

 

A adoção do termo “liberação” é bastante relevante e adequada, tendo em vista que o termo “desembaraço” é, muitas vezes, confundido no Brasil com o termo “despacho aduaneiro” – que se refere ao procedimento de análise dos documentos de importação para verificar a possibilidade de entrada do bem no território aduaneiro22.

Dessa forma, a utilização do conceito “liberação” parece adequada, ainda que possa implicar ampla revisão das normas aduaneiras brasileiras para que se adequem à nova linguagem proposta pelo CAM. Vale ressaltar, também, que o termo liberação é o mesmo utilizado pelo AFC.

  1. Conceito de mercadoria

Outro conceito importante trazido pelo CAM é o de mercadoria, a qual é definida como “bem suscetível de um destino aduaneiro”. Tal conceito não é definido atualmente pela legislação brasileira e é utilizado por vezes com significados diferentes pela legislação e jurisprudência, a depender do assunto tratado.

Além disso, a ausência de um conceito legal expresso de mercadoria no Brasil faz que tratados e acordos internacionais ratificados e internalizados no País empreguem, em sua tradução para o português, ora o termo “mercadoria”, ora “bem”. Essa falta de uniformi- zação conceitual implica possíveis confusões terminológicas e interpretações divergentes sobre o alcance das normas aplicáveis, o que resulta insegurança jurídica.

No âmbito doméstico, isso também acontece, já que o Regulamento Aduaneiro brasileiro, por exemplo, costuma trazer um conceito de mercadoria em linha com o proposto com o CAM, como é o caso do decreto que regula o II23 . Ao passo que a interpretação da legislação sobre ICMS traz um termo diverso. A jurisprudência tratando do tema, após longos debates, consolidou o entendimento de que, para fins de incidência de alcance de ICMS, mercadorias são bens importados e destinados à revenda24. Debates como esses poderiam ter sido evitados com a definição do termo agora trazido pelo CAM. Trata-se, portanto, de uma contribuição importante do CAM para o ordenamento jurídico brasileiro.

  1. Conceitos de normas complementares e regulamentares

 

 

 

 

  • Conforme dispõe o art. 542 do Regulamento Aduaneiro brasileiro (Decreto nº 6.759/2009), o “despacho de importação é o procedimento mediante o qual é verificada a exatidão dos dados declarados pelo importador em relação à mercadoria importada, aos documentos apresentados e à legislação específica”.

23Decreto-Lei nº 37, de 18 de novembro de 1966. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Decreto-Lei/Del0037.htm. Acesso em: 10 de maio de 2019.

  • A Lei Complementar nº 87, de 13 de setembro de 1996, prevê que o ICMS incide sobre “operações relativas à circulação de mercadorias”. O Superior Tribunal de Justiça (STJ) já considerou que esse dispositivo implica que “mercadorias, em apertada síntese, são bens móveis destinados ao comércio” (STJ, AgRg no Recurso Especial nº 1.023.214 – SC (2008/0011507-9), Rel. Min. Humberto Martins, 2010). Da mesma forma, uma decisão do Tribunal de Justiça do Mato Grosso do Sul já declarou que “[…] [m]ercadoria, no contexto da Lei Tributária instituidora do ICMS, significa o bem ou objeto produzido ou adquirido com finalidade de venda ou revenda” (TJ/MS, Feito Não especificado 40497 MS 040497-5, Rel. Des. José Benedicto de Figueiredo, 2002).

 

 

 

 

CÓDIGO ADUANEIRO DO MERCOSUL: AVANÇOS E IMPACTOS PARA O BRASIL

 

 

 

 

 

 

 

 

O CAM traz também duas definições importantes sobre as formas de alteração e/ou complementação de seu texto no âmbito do Mercosul, que podem ser realizadas por meio de normas regulamentares e complementares. Tais normas, uma vez aprovadas, produzem efeitos sobre todos os Estados Membro do bloco.

Normas regulamentares correspondem a disposições editadas ou a editar pelos órgãos do Mercosul necessárias à aplicação do CAM. Em outras palavras, são normas de hierarquia inferior ao CAM e que têm como objetivo regulamentá-lo.

Normas complementares, por vez, são as disposições editadas ou a editar pelos órgãos do Mercosul em matéria aduaneira que não constituam normas regulamentares. Nesse sentido, deve-se chamar a atenção para o fato de que essas normas complementares não guardam qualquer semelhança com as normas complementares brasileiras. No contexto do Mercosul, tais normas versarão sobre temas aduaneiros que não foram disciplinados pelo CAM, como, por exemplo, infrações e penalidades aduaneiras.

Além das definições trazidas pelo artigo 3º, o CAM também traz outros conceitos impor- tantes, como é o caso das noções de zonas aduaneiras, as quais seguem, via de regra, as mesmas conceituações já utilizadas pela legislação brasileira25:

  1. Conceito de Zona Primária Aduaneira

De acordo com o CAM26, a Zona Primária Aduaneira corresponde à

 

área terrestre ou aquática, ocupada pelos portos, aeroportos, pontos de fronteiro e suas áreas adjacentes e outras áreas do território aduaneiro, delimitadas e habilitadas pela Administração Aduaneira, onde se efetua o controle da entrada, permanência, saída ou circulação de mercadorias, meios de transporte e pessoas.

De forma resumida, portanto, a Zona Aduaneira Primária corresponde aos locais de circulação de mercadoria demarcados pela autoridade.

  1. Conceito de Zona Secundária Aduaneira

A Zona Secundária Aduaneira, de acordo com o CAM27, consiste em toda a parte do ter- ritório aduaneiro não compreendida pela zona primária. Ou seja, corresponde às áreas não demarcadas do território nacional.

 

 

 

 

 

 

  • Conforme disposto nos artigos 3º e 4º do Regulamento Aduaneiro (Decreto nº 759/2009). 26 Artigo 4º do CAM.
  • Artigo 5º do

 

 

 

 

3 ESTRUTURA E PRINCIPAIS DISPOSITIVOS

 

 

 

 

 

 

 

  1. c) Conceito de Zona de Vigilância Aduaneira Especial

O CAM28 prevê ainda um terceiro conceito de zona aduaneira, a Zona de Vigilância Aduaneira Especial. Esta faz parte da Zona Secundária Aduaneira e, em virtude de sua proximidade da fronteira, portos ou aeroportos, é especialmente delimitada para garantir melhor controle aduaneiro. Nesta zona, a circulação de mercadorias é submetida a disposições especiais de controle.

 

 

  • ÂMBITO DE APLICAÇÃO DO CAM

 

Conforme dispõe o art. 1.2 do CAM,

 

a legislação aduaneira do Mercosul será aplicada à totalidade do território dos Estados Partes e aos enclaves29 concedidos a seu favor, e regulará o comércio internacional dos Estados Partes do Mercosul com terceiros países ou blocos de países.

Por sua vez, o art. 2º do CAM complementa dispondo que o território aduaneiro do Mercosul é aquele no qual se aplica a legislação aduaneira comum do Mercosul.

É interessante notar que o conceito de território aduaneiro no âmbito de aplicação do CAM foi expandido em relação ao tradicionalmente desenvolvido nos primórdios do Mercosul, em que as Zonas Francas estavam, via de regra, excluídas.

Conforme consta do Anexo da Resolução GMC nº 40/2006, que estabeleceu definições e diretrizes a serem utilizadas como base para redação do Projeto de Código Aduaneiro do Mercosul, a definição indicada de território aduaneiro do Mercosul era daquele em “que se aplica um único regime tarifário e de restrições de caráter econômico às importações e às exportações do mesmo”. Ademais, ficou estabelecido expressamente nas diretrizes que “[…] as zonas francas, assim como os espaços aéreos correspondentes a tais âmbitos, não são parte do território aduaneiro do Mercosul”.

Diante da constatação de que a Zona Franca de Manaus (ZFM) ficaria excluída do território aduaneiro do Mercosul e, portanto, não poderia ser incluída em futuros acordos preferenciais assinados pelo bloco, bem como de que haveria a incidência do imposto de importação quando um bem da ZFM fosse introduzido em qualquer um dos Estados Partes, incluindo o Brasil, houve intensa negociação do governo brasileiro para que o conceito fosse modificado, de forma a evitar que tal exclusão viesse a ocorrer – a qual foi bem-sucedida30.

 

  • Artigo 6º do
  • Conforme disposto no 3º do CAM, enclave se refere à “parte do território de um Estado não integrante do Mercosul na qual se permite a aplicação da legislação aduaneira do Mercosul, nos termos do acordo internacional que assim o estabeleça”.
  • MEIRA, Tributos sobre o Comércio Exterior. São Paulo: Saraiva, 2012.

 

 

 

 

CÓDIGO ADUANEIRO DO MERCOSUL: AVANÇOS E IMPACTOS PARA O BRASIL

 

 

 

 

 

 

 

 

  • REGIMES ADUANEIROS E REGIMES ADUANEIROS ESPECIAIS

 

Uma das maiores alterações trazidas pelo CAM à sistemática das operações de comércio exterior diz respeito à conceituação, à classificação e à limitação dos regimes aduaneiros, sejam eles comuns ou especiais.

No que se refere às importações, mais especificamente, o Código prevê, em seu art. 35, que a mercadoria que ingressa no território aduaneiro do Mercosul deverá receber um dos seguintes destinos aduaneiros: i) inclusão em um regime aduaneiro de importação;

  1. ii) retorno ao exterior31; iii) abandono32; ou iv) destruição33.

 

Para fins de regimes aduaneiros especiais, a única hipótese relevante é a primeira. De acordo com o CAM34, a mercadoria ingressada no território aduaneiro em regime aduaneiro comum de importação poderá ser incluída nas seguintes categorias:

 

QUADRO 3 – Classificação de Regimes Aduaneiros no CAM

 

Regime Aduaneiro Características
 

Importação definitiva

–  Mercadoria adquire livre circulação no território aduaneiro.

–  Sujeita ao pagamento de tributos aplicáveis e outras formalidades.

–  Sujeito a proibições e restrições aplicáveis.

 

Admissão temporária para reexportação no mesmo estado

–  Importação com finalidade e prazo de permanência determinados.

–  Obrigação de reexportação da mercadoria no mesmo estado.

–  Isenção total ou parcial dos tributos aduaneiros incidentes, exceto taxas.

 

 

Admissão temporária para aperfeiçoamento ativo

–  Importação de mercadoria destinada a determinada operação de transformação, elaboração, reparo ou outra autorizada.

–  Necessidade de exportação dos produtos resultantes em prazo determinado.

–  Isenção total do pagamento de tributos aduaneiros, exceto taxas.

 

 

 

 

 

 

  • Conforme determina o art. 71 do CAM, “o retorno ao exterior consiste na saída sob controle aduaneiro, sem o pagamento dos tributos aduaneiros nem a aplicação de proibições ou restrições de caráter econômico, da mercadoria ingressada no território aduaneiro que se encontre em condição de depósito temporário de importação ou sob o regime de depósito aduaneiro, de acordo com o estabelecido nas normas regulamentares, sempre que não haja sofrido alterações em sua natureza”.
  • Conforme determina o 72 do CAM, será considerada situação de abandono a mercadoria: “(a) com prazo de permanência em depósito temporário vencido; (b) cujo abandono expresso e voluntário tenha sido aceito pela Administração Aduaneira; ou (c) submetida a despacho aduaneiro, cujo trâmite não haja sido concluído no prazo por razões atribuíveis ao interessado”.
  • Conforme dispõe o art. 73 do CAM, serão submetidas à destruição durante o despacho aduaneiro de ingresso, por determinação da Administração Aduaneira, as mercadorias que atentem contra a moral, a saúde, a segurança, a ordem pública ou o meio
  • 36 do CAM.

 

 

 

 

3 ESTRUTURA E PRINCIPAIS DISPOSITIVOS

 

 

 

 

 

 

 

Regime Aduaneiro Características
 

 

 

Transformação sob controle aduaneiro

–  Importação de mercadoria a ser submetida, sob controle aduaneiro, no prazo autorizado, a operações que modifiquem sua espécie ou seu estado.

–  Sem pagamento dos tributos aduaneiros, com exceção das taxas.

–  Objetivo do regime é a posterior importação definitiva do produto resultante em condições que impliquem um montante de tributos aduaneiros inferior ao que seria aplicável sobre a mercadoria originalmente importada.

 

 

Depósito aduaneiro

–  Mercadoria importada é diretamente armazenada em depósito/local alfandegado.

–  Isenção total do pagamento de tributos aduaneiros, exceto taxas.

–  Deverá haver posterior inclusão da mercadoria em outro regime aduaneiro.

 

 

Trânsito aduaneiro

–  Mercadoria é autorizada a circular, sob controle aduaneiro, de uma Aduana de partida a outra de destino dentro do território aduaneiro.

–  Regime comum à importação e à exportação.

–  Sem pagamento dos tributos aduaneiros nem aplicação de restrições de caráter econômico.

Fonte: CNI, 2019. Elaboração do Autor.

 

 

 

O quadro 3 acima aponta que o CAM estabelece, para todos os Estados Partes, as modalidades do regime aduaneiro de importação, as suas condições e as características, buscando harmonizar e simplificar o tratamento dado às mercadorias no território aduaneiro do Mercosul.

Considerando que essas são as modalidades comuns e com a finalidade de regulamentar casos específicos que, por certas peculiaridades, precisam de tratamento diferenciado, o CAM traz também o que chama de regimes aduaneiros especiais – que nada mais são do que determinações sobre tratamentos diferenciados a serem aplicados a circunstâncias específicas.

 

 

Antes do CAM, cada Estado Parte tinha o próprio conceito, utilidade e classificação do que seriam seus regimes aduaneiros especiais. Todavia, para tentar evitar a confusão de conceitos enfrentada pelas empresas a cada vez que seus produtos atravessavam uma

 

 

 

 

CÓDIGO ADUANEIRO DO MERCOSUL: AVANÇOS E IMPACTOS PARA O BRASIL

 

 

 

 

 

 

 

 

das fronteiras no Mercosul, o CAM apresenta uma lista única do que deve ser tratado por regime especial, bem como estabelece que outros eventuais regimes aduaneiros especiais só poderão ser criados pelos órgãos competentes do bloco, o que impede que os Estados mantenham a criação unilateral de medidas e benefícios desse tipo.

De acordo com o art. 101 do CAM, os regimes aduaneiros especiais aplicáveis no Mercosul são:

  • Pertences de
  • Provisões de
  • Franquias diplomáticas.
  • Remessas postais
  • Remessas de assistência e
  • Comércio fronteiriço.
  • Contêineres.
  • Meios de transporte
  • Retorno de
  • Remessas em consignação.
  • Substituição de

 

 

 

 

 

 

Uma das maiores alterações

trazidas pelo CAM à sistemática das operações de comércio exterior diz respeito à conceituação, à classificação e à limitação dos regimes aduaneiros, sejam eles comuns ou especiais. Essa mudança terá impacto direto e significativo

sobre as normas aduaneiras nacionais

Ainda que cada um dos regimes possua características específicas e vise atender a situações diferenciadas, é pos- sível verificar que todas elas possuem, em comum, o fato de que são operações sem valor comercial e que não visam abastecer o mercado. Portanto, diante da ausência de situa- ções típicas de importação e exportação de mercadorias para operações de compra e venda, as mesmas recebem tratamento simplificado e são eximidas da incidência de tributos aduaneiros.

A adoção de critérios e conceitos padronizados para os regi- mes aduaneiros e regimes aduaneiros especiais no Mercosul é positiva, já que favorece a aplicação de regras mais claras, tratamentos mais previsíveis e permite uma compreensão por parte das empresas que atuam no comércio exterior

 

 

 

 

3 ESTRUTURA E PRINCIPAIS DISPOSITIVOS

 

 

 

 

 

 

 

do bloco. Por outro lado, devemos reconhecer que essa mudança terá impacto direto e significativo sobre as normas aduaneiras nacionais.

No caso do Brasil, por exemplo, como se verá na próxima seção, as categorias de regimes aduaneiros previstos no CAM não correspondem aos regimes aduaneiros comuns vigentes no país, para os quais, via de regra, há obrigação de recolhimento de tributos. Os benefícios fiscais, como isenção, suspensão parcial ou total de tributos incidentes nas operações de comércio exterior e outros tratamentos diferenciados, são atualmente realizados pela Receita Federal do Brasil (RFB) e pelas demais autoridades envolvidas por meio dos chamados regimes aduaneiros especiais35.

Segundo a regra geral brasileira, considera-se como regime aduaneiro comum apenas a importação – com a incidência de tributos e a sujeição das mercadorias às regras gerais de fiscalização aduaneira –, ao passo que os regimes especiais são aqueles regimes econômicos que regem situações excepcionais e que necessitam de análise/autorização específica da autoridade aduaneira sobre o caso concreto para que sejam conferidos benefícios tributários e/ou procedimentais.

Por tal motivo, o Brasil trata como regimes especiais os depósitos aduaneiros, a admissão temporária de importação e exportação e o trânsito aduaneiro. Já para as normas e definições do CAM, essas são modalidades de regimes aduaneiros comuns.

Além disso, o Brasil criou outros regimes não previstos no CAM para conferir benefícios a setores e atividades específicas, como o Regime Aduaneiro Especial de Importação e Exportação de Bens Destinados à Pesquisa e Lavra de Petróleo e Gás (Repetro)36, o Regime Tributário para Incentivo à Modernização e à Ampliação de Estrutura Portuária (Reporto)37, o Regime Especial Tributário para a Indústria de Defesa (Retid)38 e o Regime Aduaneiro Especial de Importação de Petróleo Bruto e seus Derivados (Repex)39.

O quadro 4 apresenta as diferenças entre os conceitos e as modalidades de regimes aduaneiros especiais previstos pelo CAM e pela legislação brasileira, permitindo a melhor compreensão das divergências existentes:

 

 

 

 

Acesso em 10 maio 2019.

Acesso em 10 maio 2019.

 

 

 

 

CÓDIGO ADUANEIRO DO MERCOSUL: AVANÇOS E IMPACTOS PARA O BRASIL

 

 

 

 

 

 

 

 

QUADRO 4 – Comparação entre Conceitos de Regime Aduaneiro

 

Regime                                                         CAM                                   Brasil
Importação Definitiva Comum Comum
Admissão Temporária Comum Especial
Depósito Aduaneiro Comum Especial
Trânsito Aduaneiro Comum Especial
Bagagem Especial Comum
Pertences de Tripulantes Especial Especial
Provisões de Bordo Especial Especial
Franquias Diplomáticas Especial Simplificado
Remessas Postais Internacionais Especial Simplificado
Amostras Especial Especial
Remessas de Assistência de Salvamento Especial Especial
Comércio Transfronteiriço Especial Comum
Contêineres Especial Especial
Meios de Transporte Comerciais Especial Especial
Retorno de Mercadoria Especial Simplificado
Remessas em Consignação Especial Comum
Substituição de Mercadoria Especial Especial
REPETRO Especial
REPORTO Especial
RETID Especial
REPEX Especial

Fonte: CNI, 2019. Elaboração do Autor.

 

 

 

Ao considerar que o CAM, se for internalizado pelo Brasil, será incorporado ao ordena- mento jurídico nacional por meio de decreto – que é uma norma de nível hierárquico igual ou superior40 àquelas utilizadas para criar os regimes especiais – e posterior às então vigentes41, ele automaticamente terá prevalência de aplicação, revogando ou modificando os diversos regimes aduaneiros brasileiros que não sejam compatíveis com os conceitos firmados no âmbito do Mercosul, conforme destacado no quadro 4 acima.

 

 

 

 

  • Ao considerar que, em alguns casos, os regimes são criados ou disciplinados por meio de instruções normativas e/ou
  • Seguindo as regras gerais de interpretação do Direito, quando houver conflito entre normas de igual hierarquia, deverá prevalecer a mais recente (critério temporal) ou a mais especializada (critério de especialização). Nesse contexto, verifica-se que, caso incorporado ao ordenamento jurídico brasileiro, o CAM deverá prevalecer sobre as normas anteriormente publicadas pelas autoridades aduaneiras em função dos dois critérios: será norma mais recente e mais

 

 

 

 

3 ESTRUTURA E PRINCIPAIS DISPOSITIVOS

 

 

 

 

 

 

 

Segundo entrevistas realizadas, durante a elaboração do estudo, à equipe de nego- ciação brasileira para assuntos aduaneiros, é possível apreender que a o Brasil deverá optar por manter todos os regimes aduaneiros especiais vigentes no país a partir da reorganização das normas e estrutura atual. Mais especificamente, acreditam que, na implementação dos regimes aduaneiros comuns e especiais nos moldes do CAM, se poderia criar “subcategorias” desses grupos, alocando, assim, os regimes existentes no Brasil. Por exemplo, o REPEX seria realocado como uma submodalidade da admissão temporária.

A possibilidade de manutenção integral dos regimes aduaneiros existentes no Brasil parece demasiadamente otimista, considerando que alguns dos atuais regimes especiais trazem vantagens não previstas no CAM, inclusive contendo e misturando benefícios aduaneiros e de tributação interna. Assim como pelo trâmite legal necessário para que tais adequações e reclassificações sejam realizadas, via decreto – o que parece ser complexo tanto em termos de conteúdo, quanto de processo. Assim, ressalta-se que este é um ponto de atenção cujos desdobramentos deverão afetar diretamente as empresas que se beneficiam de regimes aduaneiros especiais atualmente em vigor, ainda que temporariamente.

 

 

  • TRIBUTOS ADUANEIROS

 

O Título XI do CAM, composto pelos artigos 157 a 171, trata de um dos assuntos mais sensíveis aos governos envolvidos: tributos aduaneiros.

Desde seu primeiro dispositivo, o art. 157, observam-se contribuições importantes em termos práticos e conceituais. De acordo com o disposto no CAM – seguindo de forma cuidadosa as regras gerais do Acordo Geral de Tarifas e Comércio (GATT) a esse respeito –, são considerados tributos aduaneiros apenas o imposto de importação e as taxas devidas em contrapartida às atividades ou serviços prestados pelas autoridades aduaneiras durante a importação ou exportação.

Isso significa que, nos termos do CAM, não poderão ser exigidos outros tributos sobre as operações de importação como se aduaneiros fossem. No caso do Brasil, especificamente, isso significa que apenas o imposto de importação e exportação são devidos e que os chamados Programa de Integração Social – Importação (PIS-Importação) e Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social – Importação (Cofins-Importação), por exem- plo, não poderiam ter esse nome ou incidir sobre as operações como se fossem tributos aduaneiros. Assim, seria necessário modificar sua forma de incidência para que os mesmos fossem dissociados do processo de nacionalização das mercadorias.

 

 

 

 

CÓDIGO ADUANEIRO DO MERCOSUL: AVANÇOS E IMPACTOS PARA O BRASIL

 

 

 

 

 

 

 

 

Da mesma forma, de acordo com esta definição dada pelo CAM, a única taxa que deveria ser cobrada no modelo atual dos operadores de comércio exterior é a taxa de utilização do Sistema Integrado de Comércio Exterior (Siscomex).

 

 

No que concerne ao imposto de exportação, tendo em vista a sensibilidade do tema e o fato de que a maioria dos Estados não recolhem tais tributos como forma de incentivar a competitividade internacional de suas empresas e de equilibrar suas balanças comerciais, optou-se por deixar o assunto fora do CAM, permitindo que cada membro trate a questão de forma individual em sua legislação interna. A única ressalva é que as regras gerais e princípios do CAM devem ser respeitados neste processo.

Outro ponto inovador do Código refere-se às modalidades de extinção das obrigações aduaneiras, disciplinadas no art. 162. Além dos modos tradicionais de extinção das obrigações (pagamento, transação em juízo, prescrição e outros meios estabelecidos pelas legislações nacionais), o CAM traz a compensação como um dos modos expres- samente previstos.

Tal previsão é inovadora e flexibilizará o que vem ocorrendo no Brasil a favor das empre- sas que atuam no comércio exterior, já que as regras atualmente vigentes restringem a possibilidade de compensação de créditos tributários oriundos de pagamentos em maior ou em duplicidade, sobre tributos originalmente devidos, no momento do registro da declaração de importação42.

Em outras palavras, isso significa que as empresas que possuem créditos relativos a outros tributos federais obtidos em outras operações, como de IPI, por exemplo, ou mesmo em razão de reclamações junto à União por valores pagos indevidamente à maior, poderão utilizá-los como meio de pagamento do imposto de importação, o que traria às empresas o benefício de redução do acúmulo de créditos tributários federais, bem como do não desembolso de novos recursos para o registro da importação.

 

  • A autoridade aduaneira impõe tal restrição sob o argumento de que o Siscomex não permite a avaliação de pedidos de compensação e justifica sua conduta no 74, §3º, II da Lei nº 9.430/1996.

 

 

 

 

3 ESTRUTURA E PRINCIPAIS DISPOSITIVOS

 

 

 

 

 

 

 

Deve-se destacar, todavia, que, para que essa previsão funcione, os governos dos Estados deverão ajustar seus sistemas para permitir que a compensação seja reconhecida como forma de pagamento. Por exemplo, no caso do Brasil, será necessário que o Portal Único de Comércio Exterior aceite que, alternativamente ao pagamento eletrônico com recursos próprios, o importador possa demonstrar a existência de crédito junto à Fazenda Nacional e utilizá-lo para quitar os valores devidos na importação.

Ainda que o funcionamento da compensação não seja demasiado complexo, deverá haver cooperação da Receita Federal em adequar seu sistema operacional para aceitar o novo processo e permitir que a medida seja executada na prática. Se, por um lado, isso poderá desincentivar fraudes tributárias, por outro, poderá implicar, em certa medida, a redução da arrecadação, já que haverá mais um incentivo para que as empresas reclamem pelos créditos a que têm direito e que, não raramente, são ignorados pelo excesso de burocracia e dificuldade de utilização.

Por fim, o CAM busca eliminar mais um grande problema que atualmente ocorre nas importações do bloco: a dupla incidência da TEC quando a mercadoria é originalmente exportada por terceiro país e precisa passar por mais de um país do bloco até chegar ao seu destino dentro do Mercosul. Como o fato gerador do imposto de importação passa ser a importação definitiva do bem, a livre circulação de bens passa a ser finalmente implementada, permitindo que a mercadoria seja tributada apenas em seu destino final.

 

 

  • COMITÊ ADUANEIRO DO MERCOSUL

 

O CAM estabelece que será criado um comitê do Código Aduaneiro (Comitê), que terá como objetivo zelar pela aplicação uniforme das medidas previstas no CAM e em suas normas regulamentares. O Comitê será composto por servidores das administrações aduaneiras e representantes designados pelos Estados Partes43.

Como se observa, o CAM não prevê a participação de representantes do setor privado no Comitê, o que pode prejudicar bastante seu funcionamento. A participação do setor privado pode auxiliar o Comitê não apenas na identificação dos problemas, mas também na adoção de soluções adequadas.

Nesse sentido, é importante que o governo brasileiro permita, de alguma forma, uma interação entre o Comitê do CAM e o Comitê Nacional de Facilitação de Comércio (Confac) –

 

 

 

  • 181 do CAM.

 

 

 

 

CÓDIGO ADUANEIRO DO MERCOSUL: AVANÇOS E IMPACTOS PARA O BRASIL

 

 

 

 

 

 

 

 

com participação do setor privado44 ou que se adote como prática a participação privada no Comitê Aduaneiro do Mercosul, bem como no Grupo de Trabalho (GT) Aduaneiro do Mercosul.

De acordo com as informações disponibilizadas pelo Mercosul, o Comitê ainda não foi criado e não há publicações de qual seria o seu modelo de funcionamento. Se, por um lado, este é um indício de que os esforços em prol da implementação do CAM ainda são incipientes, por outro, verifica-se que existe espaço para que os membros do bloco avaliem experiências internacionais relevantes e trabalhem juntos pela criação de um modelo que permita o diálogo público-privado e iniciativas de modernização e simplificação do comércio exterior que atendam às necessidades atuais do Mercosul.

Por fim, considerando que o Comitê Técnico nº 2 (CT-2) de Facilitação de Comércio passou por mudanças ao longo dos anos e atualmente cuida tanto de questões aduaneiras quanto do tema de facilitação do comércio e que tem como representantes dos Estados Partes autoridades aduaneiras e agentes técnicos dos países – que muito provavelmente seriam os mesmos a serem indicados para o Comitê do CAM –, seria interessante que, ao invés de se criar um novo órgão, o CT-2 assuma as funções previstas pelo CAM e seja o órgão responsável pela aplicação e interpretação do Código no bloco.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

  • O Confac é um colegiado da Câmara de Comércio Exterior (Camex), que tem como objetivo “orientar, coordenar, harmonizar e supervisionar” as atividades relativas a comércio exterior, a fim de implementar o AFC da OMC e reduzir custos de cumprimento com exigências da Administração Pública. Entre as características de seu funcionamento, destaca-se a existência de um subcomitê envolvendo o setor privado, permitindo o diálogo e a busca de soluções para desburocratização e melhor gestão do comércio exterior no Brasil de forma prática

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Os Estados Partes do Mercosul precisam harmonizar sua legislação interna com as disposições do CAM. Até o momento, apenas Argentina ratificou e promulgou o CAM

 

 

 

4 RATIFICAÇÃO E IMPLEMENTAÇÃO DO CAM PELOS ESTADOS PARTES45

 

 

 

 

 

 

4 RATIFICAÇÃO E IMPLEMENTAÇÃO DO CAM PELOS ESTADOS PARTES45

 

Por se tratar de um acordo internacional, o CAM precisa passar pelo processo de ratificação em cada um dos Estados Parte do Mercosul para que passe a produzir efeitos. O processo de ratificação varia conforme a legislação de cada país, mas, de forma geral, consiste na aprovação do acordo pelo Poder Legislativo (no caso do Brasil, Congresso Nacional) e na publicação do texto em forma de lei ou decreto. Com isso, o acordo passa a fazer parte do ordenamento jurídico interno de cada Estado.

Além disso, os Estados Partes do Mercosul também precisam harmonizar sua legislação interna com as disposições CAM, o que é chamado de implementação46.

Apesar de ter sido aprovado em 2010, até o momento, apenas Argentina e Brasil ratificaram o CAM conforme a seguir:

  • Argentina:

A Argentina foi o primeiro país a ratificar e internalizar o CAM.

 

O acordo foi aprovado47 em novembro de 2012 e promul- gado em dezembro de 2012 pelo Congresso argentino (Congreso Argentino)48.

 

 

 

  • A Venezuela aderiu ao Mercosul em 2012, mas está com seus direitos e obrigações atualmente suspensos, pois descumpriu seu protocolo de adesão e a cláusula democrática do Caso a suspensão da Venezuela seja retirada, o país também precisará ratificar o CAM, que, até o momento, ainda não foi internalizado. Não obstante, cumpre destacar que a Venezuela adotou recentemente a Nomenclatura Comum do Mercosul (NCM), o que representa um avanço em termos de facilitação do comércio.
  • 3º da Decisão CMC 27/10.
  • Ley 795, publicada no Boletim Oficial do dia 13 dezembro de 2012. Disponível em: http:// servicios.infoleg.gob.ar/infolegInternet/anexos/205000-209999/205934/norma.htm. Acesso em: 21 nov. 2018.
  • Decreto nº 2359/2012. Disponível em: http://servicios.infoleg.gob.ar/infolegInternet/ anexos/205000-209999/205936/norma.htm. Acesso em: 21 2018.

 

 

 

 

CÓDIGO ADUANEIRO DO MERCOSUL: AVANÇOS E IMPACTOS PARA O BRASIL

 

 

 

 

 

 

 

 

Ainda que a Argentina seja o Estado Membro que mais se debruçou sobre o impacto do CAM e seus desdobramentos, em termos políticos e acadêmicos, o processo de imple- mentação ainda não foi iniciado – o que se deve, em parte, pela não ratificação do Código dos demais signatários até o momento.

  • Brasil:

No Brasil, um tratado é considerado devidamente ratificado quando, após a aprovação da Presidência da República, é ratificado pelo Congresso Nacional49. No Brasil, o CAM foi ratificado no Congresso Nacional e publicado em forma de Decreto Legislativo em 10 de setembro de 201850.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Para a conclusão do processo de ratificação no Brasil, resta a sanção, promulgação e publicação do CAM por

meio de Decreto assinado pelo Presidente da

República

O processo de ratificação do CAM no Congresso Nacional brasileiro durou cerca de 2 (dois) anos. Em abril de 2016, a Representação Brasileira no Parlamento do Mercosul submeteu à análise da Presidência da República o texto do Código Aduaneiro. Após aprovado, o texto foi encaminhado à Câmara dos Deputados e transformado em projeto de decreto legislativo em julho de 201751.

O projeto aprovado na Câmara dos Deputados em março de 2018, foi encaminhado ao Senado Federal52 que aprovou em setembro de 2018 e transformou-o em Decreto Legislativo53. Assim, para a conclusão do processo de ratificação, resta apenas que o Presidente da República sancione, promulgue e publique a definitiva ratificação do CAM no País em forma de Decreto Federal de execução.

 

 

 

 

 

 

  • Artigo 49, I, Constituição Federal de
  • Decreto Legislativo nº 149/2018. DOU, 11 de setembro de 2018, página 03, coluna 02. Disponível em: http://www2.camara.leg.br/legin/fed/decleg/2018/decretolegislativo- 149-10-setembro-2018-787159-acordo-156365-pl.html. Acesso em: 21 de nov. de 2018.
  • Todas as informações sobre a tramitação do Projeto de Decreto Legislativo (PDC nº 708/2017) na Câmara dos Deputados estão disponíveis em: http://www.camara.gov.br/ proposicoesWeb/fichadetramitacao?idProposicao=2143861. Acesso em: 21 de 2018.
  • Ofício nº 324/2018. Disponível em: http://www.camara.gov.br/proposicoesWeb/prop_m ostrarintegra?codteor=1648070&filename=Tramitacao-PDC+708/2017. Acesso em: 21 de de 2018.
  • Disponível em: https://legis.senado.leg.br/sdleg-getter/ documento?dm=7878115&ts=1540239899594&disposition=inline. Acesso em: 21 nov.

 

 

 

 

4 RATIFICAÇÃO E IMPLEMENTAÇÃO DO CAM PELOS ESTADOS PARTES45

 

 

 

 

 

 

 

Desde o início do processo de ratificação até a publicação do Decreto Legislativo, levou-se quase uma década mesmo sem que houvesse qualquer oposição técnica ou política para aprovação do CAM no Congresso e com somente alguns poucos ajustes da Fazenda Nacional na versão traduzida para português.

Os desdobramentos sobre a legislação nacional após a devida ratificação do Código e, por conseguinte, a materia- lização do CAM no dia a dia do comércio exterior brasileiro, ainda, são extensos e podem levar algum tempo.

  • Paraguai:

O CAM ainda não foi ratificado pelo Paraguai. O projeto está em trâmite no Senado paraguaio desde 201254, tendo sido aprovado por duas comissões e, no entanto, rejeitado pela Comissão de Fazenda e Orçamento (Hacienda y Presupuesto).

Conforme noticiado pela mídia paraguaia, parte dos seto- res nacionais vem se posicionando de forma contrária ao CAM, principalmente por não existir uma regra clara para a distribuição de renda gerada pelos tributos aduaneiros55 diante da extinção da dupla cobrança da TEC para merca- dorias provenientes de terceiros países que circulem por mais de um Estado do bloco, o que pode vir a prejudicar significativamente a arrecadação do Paraguai, que, por um lado, não possui fronteira marítima e, por outro, tem na atividade aduaneira, importante fonte de arrecadação56.

 

Apesar disso, existem também posicionamentos favoráveis ao CAM, que entendem que o Código pode favorecer o Paraguai, que é um país em desenvolvimento e sem acesso ao mar57.

 

O CAM ainda não foi ratificado pelo Paraguai e pelo Uruguai

 

 

 

 

 

 

 

 

 

CÓDIGO ADUANEIRO DO MERCOSUL: AVANÇOS E IMPACTOS PARA O BRASIL

 

 

 

 

 

 

 

 

É esperado que a recente ratificação do CAM pelo Brasil impulsione a ratificação pelo Paraguai58.

  • Uruguai:

O CAM ainda não foi ratificado pelo Uruguai. O projeto está em trâmite na Câmara de Representantes do Parlamento uruguaio desde 201259.

De acordo com a Câmara Nacional de Comércio e Serviços do Uruguai (Camara Nacional de Comercio y Servicios del Uruguay), a principal preocupação com relação ao CAM é que ele colocaria fim aos Portos Livres60 e ao Aeroporto Livre de Carrasco do Uruguai61, que, sob a perspectiva do CAM, são equiparados a Zonas Francas62. No entanto, com a aprovação do CAM em 2010, o Uruguai sentiu necessidade de modernizar o próprio código aduaneiro63. Com efeito, em 2012, o poder executivo do governo uruguaio apresentou o projeto de lei referente ao Código Aduanero de la República Oriental del Uruguay (CAROU)64. Em 2014, o Senado e a Câmara de Representantes do Uruguai aprovaram e promulgaram-no65.

A aprovação do CAM foi, portanto, um marco para o surgimento do novo Código Aduaneiro do Uruguai66, que realizou mudanças e modernizações nas normas aduaneiras uruguaias tanto em termos de conteúdo quanto de forma – o que pode ser percebido pela própria disposição dos artigos, seguindo lógica bastante semelhante ao CAM – já se adequando a muitas das regras previstas no Código e abrindo espaço para uma implementação mais rápida e fluida.

O quadro 5, a seguir, apresenta, de forma resumida, o momento atual nos processos de internalização do CAM em cada um dos Estados signatários.

 

 

 

 

 

 

  • Disponível em: https://tradenews.com.ar/por-que-el-mercosur-es-una-valla-infranqueable-para-las-retenciones/. Acesso em: 19

2018.

  • Informações sobre o trâmite do CAM no Parlamento Uruguaio estão disponíveis em: https://parlamento.gub.uy/documentosyleyes/ ficha-asunto/113904/ficha_completa. Acesso em: 22 2018.
  • Os Portos Libres (Puertos Libres) são portos com regimes fiscais e aduaneiros especiais, que não exigem autorizações e trâmites

Mais informações em: http://www.inalog.org.uy/es/normativa-de-puertos-libres/. Acesso em: 22 nov. 2018.

  • Assim como os Portos Libres, o Aeroporto Livre opera sob regimes fiscal e aduaneiro especiais, sem autorizações e trâmites

Mais informações em: http://www.inalog.org.uy/es/normativa-aeropuertos/. Acesso em: 22 nov. 2018.

 

 

 

 

4 RATIFICAÇÃO E IMPLEMENTAÇÃO DO CAM PELOS ESTADOS PARTES45

 

 

 

 

 

 

 

QUADRO 5 – Internalização do CAM pelos Estados-Partes do Mercosul

 

 

País

 

Ratificação

Situação atual do processo de ratificação/implementação  

Principais preocupações dos países

 

 

 

 

 

 

 

Aguardando os demais signatários ratificarem o Código para a entrada em vigor de suas regras.

Processo de implementação não iniciado.

Ausência de regras comuns sobre exportação;

Necessidade de implementação de sistemas de gestão de risco e futura informatização e integração de procedimentos.

Compatibilidade entre CAM e o Acordo sobre Transporte Internacional Terrestre67 (ATIT).

 

 

 

 

 

 

 

Decreto Legislativo nº 149 publicado em 2018. Aguardando sanção e promulgação da Presidência da República.

Não existem projetos divulgados sobre iniciativas de implementação.

A restrição na criação e aplicação de regimes aduaneiros especiais pode ser um desafio.

A impossibilidade de ampliação da base de cálculo de tributos e taxas incidentes na importação deverá afetar cálculos, como no caso da inclusão indevida da capatazia atualmente realizada68.

 

 

 

 

 

 

Projeto em trâmite no Senado paraguaio desde 2012.

Ausência de regra clara sobre a distribuição dos tributos aduaneiros arrecadados nas fronteiras do bloco em razão da eliminação da dupla cobrança da TEC para mercadorias originárias de terceiros países que circulem por mais de um Estado Parte do bloco.69
Projeto em trâmite na Câmara de Representantes do Parlamento uruguaio desde 2012.  

Fonte: CNI, 2019. Elaboração do Autor.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

  • Principal instrumento normativo vigente na Argentina para regulamentar o transporte terrestre de 68 Informações obtidas por meio das entrevistas realizadas pela CNI junto à RFB.

69 Disponível em: http://www.abc.com.py/edicion-impresa/economia/exhortan-a-analizar-con-cuidado-el-codigo-aduanero-del- mercosur-1100009.html. Acesso em: 22 nov. 2018 e https://www.ultimahora.com/paraguay-no-permitira-vigencia-un-codigo-aduanero- impuesto-n579801.html. Acesso em: 19 nov. 2018.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Para que o Mercosul possa implementar um sistema que efetivamente promova a eliminação de barreiras, harmonização e integração, é fundamental que as diretrizes do Acordo de Facilitação de Comércio da OMC sejam respeitadas

 

 

 

5 OUTROS ASPECTOS RELEVANTES: RELAÇÃO ENTRE CAM E ACORDO DE FACILITAÇÃO DO COMÉRCIO DA OMC

 

 

 

 

 

 

5 OUTROS ASPECTOS RELEVANTES: RELAÇÃO ENTRE CAM E ACORDO DE FACILITAÇÃO DO COMÉRCIO DA OMC

O CAM tem objetivos em comum com o AFC da OMC, assinado em 2013, durante a Conferência de Bali, na Indonésia, e que já foi ratificado pelos quatro Estados Partes fundadores do Merco- sul70. O AFC tem como objetivo a simplificação, a modernização e a harmonização dos processos de importação e exportação, com o fim de promover a facilitação do comércio e, em última instância, possibilitar maior integração entre países por meio do comércio internacional.

Diante disso, as disposições do CAM devem estar em confor- midade com o AFC. Isso se faz necessário não apenas porque os Estados Partes do Mercosul são também signatários do AFC (e devem, portanto, cumprir com suas disposições), mas, principalmente, porque o AFC dispõe sobre as melhores prá- ticas de facilitação de comércio. Assim, para que o Mercosul possa implementar um sistema que efetivamente promova a eliminação de barreiras, harmonização e integração, é funda- mental que as diretrizes do AFC sejam respeitadas.

Como será visto a seguir, o CAM e o AFC possuem vários pontos de intersecção. Ao tratar de algumas questões, o AFC traz mais detalhes que o CAM e, em algumas situações, traz até mesmo previsões diferentes das do CAM. Nesses casos específicos, entende-se que os Estados Partes do Mercosul devem imple- mentar o CAM, mas complementar suas normas a partir das regras estabelecidas pelo AFC, uma vez que ambos são fontes

 

 

 

 

 

70 Informação disponível em: https://www.wto.org/english/tratop_e/tradfa_e/tradfa_ agreeacc_e.htm. Acesso em: 27 nov. 2018.

 

 

 

 

CÓDIGO ADUANEIRO DO MERCOSUL: AVANÇOS E IMPACTOS PARA O BRASIL

 

 

 

 

 

 

 

 

de obrigações, mas o AFC impõe previsões mais específicas, detalhadas e adequadas do ponto de vista de facilitação do comércio.

  • Transparência e previsibilidade de conceitos e previsões: pontos convergentes

Como mencionado nas seções anteriores, o CAM dá grande ênfase a conceitos e delimi- tações das obrigações e normas que discute. Este cuidado está em linha com o próprio conceito de facilitação do comércio, enquanto movimento de busca por simplificação e segurança jurídica das partes envolvidas e das obrigações objetivas trazidas pelo AFC.

Ainda que todas as obrigações do AFC tenham como intuito a transparência e a previsi- bilidade das normas e regras sobre o comércio internacional na fronteira, seus artigos 1 e 5 – que se referem à obrigação de publicação e disponibilidade de informação e a outras medidas para aumentar imparcialidade, não discriminação e transparência respectivamente – parecem receber especial atenção do CAM, o que é um avanço favorável ao setor privado.

De forma indireta, os artigos 6 e 10 do AFC, que versam sobre impostos e taxas aduaneiros e formalidades de importação, exportação e trânsito aduaneiro, também são endereçados, o que faz do CAM uma fonte de maior segurança jurídica, e regra mais completa e deli- mitada do que a estrutura atualmente aplicada no Brasil – que não raramente confunde as empresas atuantes no comércio exterior e traz insegurança sobre a forma correta de proceder e os riscos inerentes a possíveis descumprimentos.

  • Gestão de risco

Tanto o CAM quanto o AFC trazem disposições sobre a gestão de risco pelas autori- dades aduaneiras.

O CAM prevê que as Administrações Aduaneiras devem desenvolver sistemas de análise de risco, com o fim de identificar, avaliar e tratar riscos71. De acordo com o CAM, o objetivo do sistema de gestão de risco é permitir que a Administração Aduaneira oriente suas atividades de controle sobre mercadorias e simplifique o fluxo de mercadorias de baixo risco72. O CAM também prevê que a gestão de risco deve ser aplicada nas diferentes fases de controle aduaneiro e deve ser preferencialmente informatizada73.

De forma semelhante, o AFC diz que os Estados Membros devem, na medida do possível, adotar e manter sistemas de gestão de risco para controle aduaneiro74. De acordo com

 

 

 

  • 147, 1, do CAM.
  • 147, 2, do CAM.
  • 147, 3, do CAM.
  • 4.1 do AFC.

 

 

 

 

5 OUTROS ASPECTOS RELEVANTES: RELAÇÃO ENTRE CAM E ACORDO DE FACILITAÇÃO DO COMÉRCIO DA OMC

 

 

 

 

 

 

 

o AFC, a finalidade da implementação desse sistema é evitar discriminação arbitrária e injustificada ou restrições disfarçadas ao comércio internacional75.

Assim como o CAM, o AFC também estabelece que os Estados Membros devem concen- trar as atividades de controle aduaneiro em cargas de alto risco e facilitar a liberação de mercadorias de baixo risco76. Para fazer essa avaliação de cargas de alto e baixo risco, o AFC traz alguns critérios que podem ser considerados, como a classificação do produto de acordo com o Sistema Harmonizado (SH), a natureza e descrição dos bens, o país de origem e procedência, o valor, o histórico de cumprimento pelo importador/exportador e o tipo de transporte77.

Em sua redação, o CAM prevê a utilização pelos Estados Partes do Mercosul de sistemas de avaliação de risco como forma de orientar as autoridades aduaneiras em suas atividades de controle e simplificar o fluxo de mercadorias que apresentem riscos considerados baixos. Todavia, o Código não obriga os países a utilizarem sistemas informatizados para a tarefa, apenas recomenda. Da mesma forma, não traz critérios específicos para realização da avaliação de risco como faz o AFC, o que torna suas normas mais brandas e menos palpáveis do que aquelas contidas no Acordo da OMC.

Um exemplo de implementação de processo de gestão de risco é o Centro de Gerencia- mento de Riscos Aduaneiros (Cerad), criado em 2011 pela Receita Federal do Brasil (RFB). O Cerad objetiva garantir a observância da legislação nas operações de comércio exterior, sem criar obstáculos desnecessários ao comércio exterior legítimo78. Entre as diretrizes do Cerad, estão a condução de estudos técnicos para identificação de áreas de riscos aduaneiros, o aperfeiçoamento e a melhor gestão das rotinas de seleção, o gerenciamento do intercâmbio internacional de informações e a execução do controle aduaneiro com maior segurança e agilidade79.

  • Cooperação aduaneira, automação e documentação (art. 148 e 149)

Outras obrigações do CAM que dialogam de forma harmônica com o AFC dizem respeito à obrigação de sistematização e automação de recebimento de informações (art. 10.4 do AFC) e de cooperação entre autoridades aduaneira por meio da troca de informações (art. 8 do AFC).

 

 

  • 4.2 do AFC.
  • 4.3, AFC.
  • 4.4, AFC.
  • Apresentação centro de gerenciamento de riscos aduaneiros. jun. 2013. Disponível em: https://www.sindifisconacional.org.br/ mod_download.php?id=aHR0cDovL3d3dy5zaW5kaWZpc2NvbmFjaW9uYWwub3JnLmJyL2ltYWdlcy9SZWxhY29lc0ludGVybmFjaW9uY- WlzLzIwMTMvQXByZXNlbnRhY2FvQ0VSQUQyMDEzLnBkZnww. Acesso em: 29 nov. 2018.
  • Apresentação centro de gerenciamento de riscos aduaneiros. jun. 2013. Disponível em: https://www.sindifisconacional.org.br/ mod_download.php?id=aHR0cDovL3d3dy5zaW5kaWZpc2NvbmFjaW9uYWwub3JnLmJyL2ltYWdlcy9SZWxhY29lc0ludGVybmFjaW9uY- WlzLzIwMTMvQXByZXNlbnRhY2FvQ0VSQUQyMDEzLnBkZnww. Acesso em: 29 nov. 2018.

 

 

 

 

CÓDIGO ADUANEIRO DO MERCOSUL: AVANÇOS E IMPACTOS PARA O BRASIL

 

 

 

 

 

 

 

 

Nesse sentido, destaca-se que o art. 148 do CAM dispõe sobre a necessidade de utilização de sistemas informatizados e meios de transmissão eletrônica de dados no registro das operações aduaneiras, ainda que não indique que os mesmos deverão ser realizados por meio de uma janela única que sirva como único ponto de entrada das informações exigidas por todas as autoridades envolvidas no processo, tal qual prevê o AFC.

Quanto à cooperação entre autoridades aduaneiras, o art. 149 do CAM, ainda que seja breve e não disponha como o procedimento deverá ser realizado, prevê que as autoridades aduaneiras nacionais troquem informações e documentos, preferencialmente por meio eletrônico, como forma de garantir a eficiência da gestão aduaneira do bloco.

Outro ponto de destaque é a equivalência dada pelo CAM às assinaturas digitais ou eletrônicas certificadas à assinatura dos servidores aduaneiros e das pessoas vinculadas à atividade aduaneira que possuem acesso autorizado, disciplinada no art. 151. Tal avanço permite não só a dispensa de documentos físicos, como torna os processos mais rápidos e acessíveis às partes, favorecendo o fluxo comercial e reduzindo os custos relativos ao tempo de fiscalização na fronteira.

  • Uniformização e procedimentos e documentação

No artigo 178, que traz disposições transitórias sobre a circulação das mercadorias entre os Estados Partes até que a transição dos sistemas aduaneiros individuais para a União Aduaneira efetiva se complete, o CAM trata de uma questão essencial à implementação dessa nova fase do bloco: a criação e a utilização de um documento aduaneiro unificado.

Isto é, se as regras devem ser comuns e conceitos e regimes se aplicam uniformemente em todo território aduaneiro do Mercosul, faz-se necessário que os documentos exigidos sejam compatíveis.

Essa obrigação cumpre o requisito do art. 10.7 do AFC, que dispõe sobre a utilização de procedimentos de fronteira comuns e requerimentos documentais uniformes. Todavia, ainda que seja um avanço importante e que sua previsão mereça créditos, deve-se notar que o CAM não traz qualquer tipo de regra sobre como isso será feito ou mesmo a sugestão de um modelo. O Código prevê apenas que o documento deverá ser preferencialmente eletrônico e que deverá seguir o estabelecido nas normas regulamentares e complemen- tares futuramente emitidas sobre o assunto.

  • Elementos de valoração (art. 164)

Ao fortalecer as regras contidas no Acordo Geral de Tarifas e Comércio (GATT) e no AFC sobre a proibição de que custos adicionais sejam indevidamente incorporados ao valor

 

 

 

 

5 OUTROS ASPECTOS RELEVANTES: RELAÇÃO ENTRE CAM E ACORDO DE FACILITAÇÃO DO COMÉRCIO DA OMC

 

 

 

 

 

 

 

aduaneiro da mercadoria para fins do cálculo dos tributos aduaneiros, o art. 164 do CAM estabelece que o valor aduaneiro da mercadoria incluirá os seguintes elementos:

  1. Os gastos de transporte da mercadoria importada até o local de sua entrada no território
  2. Os gastos de carga, descarga e manuseio, relativos ao transporte da merca- doria importada até o local de sua entrada no território
  3. O custo da

 

Nesse sentido, o segundo ponto é especialmente relevante. Pela redação do CAM, a discussão, ainda existente no Brasil, sobre a possibilidade de valores referentes à capatazia serem adicionados à base de cálculo de tributos que tenham como fato gerador a entrada da mercadoria no território aduaneiro está expressamente proibida.

A discussão sobre a inclusão dos custos de descarga da mercadoria (capatazia) no valor aduaneiro que servirá como base de cálculo do imposto de importação decorre da atual redação do art. 4º, § 3º, da Instrução Normativa (IN) SRF 327/2003.

Apesar das recorrentes decisões judiciais no sentido de que tal inclusão é ilegal e contraria as normas da OMC, inclusive com a publicação da Súmula nº 92 pelo TRF 4 em 2016, fixando entendimento de que “o custo dos serviços de capatazia não integra o ‘valor aduaneiro’ para fins de composição da base de cálculo do imposto de importação”. A matéria encontra-se em discussão na 1ª Seção do STJ, motivo pelo qual a referida IN continua em vigor80.

A discussão hoje existente e que necessita da interpretação caso a caso dos tribunais, para que a referida taxa seja excluída, é claramente resolvida pela redação aprovada pelo CAM, pois ele deixa claro que as taxas e despesas incidentes sobre o valor aduaneiro referem-se apenas ao momento anterior de sua entrada no território aduaneiro, portanto, excluindo despesas de desembarque, desunitização, entre outras.

  • Ausência de regulamentação de infrações e penalidades aduaneiras

Talvez a maior diferença encontrada entre as disposições do CAM e do AFC se refira à regulamentação de infrações e penalidades aduaneiras. Isto porque, enquanto o AFC dá grande ênfase ao tema81, destacando sua definição, delimitando os casos de aplicação e restringindo o grau das penalidades de forma a evitar imposições desproporcionais e que sirvam como obstáculos ao comércio, o CAM omite-se completamente sobre o assunto.

 

 

  • Gastos Relativos à Descarga da Mercadoria Incluídos no Valor Aduaneiro. 2017. Disponível em http://www.portaldaindustria. com.br/publicacoes/2018/6/gastos-relativos-descarga-da-mercadoria-incluidos-no-valor-aduaneiro/. Acesso em: 29 nov. 2018.
  • 6.3 do AFC.

 

 

 

 

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Esta é uma falha grave e que enfraquece o sistema do Mercosul, uma vez que a definição de quais são as potenciais sanções a serem impostas pela administração aduaneira dos Estados Partes em caso de violação das normas do CAM, bem como da graduação das penalidades de acordo com a seriedade das infrações, são essenciais para garantir o avanço da união aduaneira.

Caso o tema das infrações e sanções aduaneiras não seja endereçado por normas com- plementares82 e discutido tão logo o CAM entre em vigor, há risco de que os objetivos do Código não se realizem, principalmente se não houver uma decisão comum sobre o que são infrações e qual o nível punitivo que se deve implementar a cada tipo com vistas ao entendimento comum do que não pode ser tolerado e em que intensidade.

Na prática, a ausência de um entendimento comum entre os Estados Partes sobre as situações a serem consideradas como infrações aduaneiras e as penalidades cabíveis em cada caso poderá desequilibrar a gestão e o controle aduaneiro das fronteiras do bloco, fazendo que existam localidades em que o fluxo de comércio seja reduzido pela severidade excessiva com que os operadores são punidos, ao passo que poderá incentivar atividades fraudulentas e de contrabando em pontos de fronteira onde as autoridades possuam interpretação mais benéfica ou frágil – dois tipos de conduta extrema e indesejáveis.

  • Programa Operador Econômico Autorizado – OEA

Outro ponto de diferença entre o CAM e o AFC é a previsão a respeito da certificação como Operador Econômico Autorizado (“OEA”). Ainda que não haja uma discordância entre as previsões dos referidos acordos, verifica-se que o nível de ambição e a importância dada a este mecanismo diverge consideravelmente.

O AFC83 prevê que os Membros devem disponibilizar medidas de facilitação adicionais a operadores que preencham determinados critérios de conformidade. O AFC traz dispo- sições detalhadas sobre quais critérios podem ou não ser estabelecidos pelos Membros, bem como sobre os benefícios que devem ser concedidos em contrapartida.

O CAM84, por vez, traz uma disposição genérica que prevê que a administração aduaneira de cada Estado Parte poderá “instituir procedimentos simplificados de controle aduaneiro e outras facilidades” para as pessoas que cumpram com determinados requisitos.

 

 

 

  • Nos termos previstos no 3º do CAM. 83 Art. 7 do AFC.
  • 15 do CAM

 

 

 

 

5 OUTROS ASPECTOS RELEVANTES: RELAÇÃO ENTRE CAM E ACORDO DE FACILITAÇÃO DO COMÉRCIO DA OMC

 

 

 

 

 

 

 

Existem, portanto, algumas diferenças entre o AFC e o CAM no que diz respeito ao programa de OEA:

  1. Nível vinculante: o CAM traz o OEA como uma faculdade (poderá) do Estado, enquanto o AFC trata a questão como uma obrigação a ser implementada pelos membros da OMC (deverá).
  2. Requisitos para operadores: a disposição do CAM sobre o programa OEA é bastante genérica e não especifica quais requisitos os operadores devem atender para serem

Apesar de o AFC não trazer uma lista exaustiva dos critérios que devem ser observados pelos Membros em seus programas OEA, ele prevê alguns exemplos de critérios de conformidade que podem ser considerados, como segurança da cadeia de suprimentos, solvência financeira, registros adequados das operações, entre outros85.

Além disso, o AFC estabelece que os critérios a serem estabelecidos pelos Membros não podem ser aplicados de forma arbitrária ou injustificadamente discriminatória, tampouco restringir a participação de empresas de pequeno e médio porte no programa OEA86. Por fim, o AFC dá grande ênfase ao estabelecimento de acordos de reconhecimento mútuo no programa OEA como forma de simplificar procedimentos, evitar que haja dupla fiscalização e análise de documentos em cada lado da fronteira e favorecer a cooperação transfronteiriça, o que é silenciado no caso do CAM.

  1. Benefícios: o CAM não prevê quais tipos de benefícios podem ser conce- didos aos operadores autorizados, como faz o Este último traz uma lista de benefícios87 e prevê que ao menos três itens dessa lista devem ser concedidos pelos Membros a seus operadores autorizados. Alguns dos benefícios previstos são: baixos índices de inspeção e fiscalização, redução de garantias, requisitos documentais mais brandos, menor tempo de liberação.

Como visto, o AFC prevê que a instituição do programa OEA é uma obrigação dos Membros, bem como traz diretrizes específicas e detalhadas sobre os critérios e benefícios a serem estabelecidos por cada país. Dessa forma, os Estados Partes do Mercosul, ao criarem e implementarem seus programas de OEA, devem observar as disposições do AFC.

 

 

 

  • 7.2(a) do AFC.
  • 7.2(b) do AFC.
  • 7.3 do AFC.

 

 

 

 

CÓDIGO ADUANEIRO DO MERCOSUL: AVANÇOS E IMPACTOS PARA O BRASIL

 

 

 

 

 

 

 

 

Ressalta-se, ainda, o fato de que os Estados Partes fundadores do Mercosul já possuem programas OEA88. Ademais existe um Acordo de Reconhecimento Mútuo entre Brasil e Uruguai89, que garante que exportadores e transportadores de um Estado possam usufruir dos benefícios estabelecidos no programa no território do outro.

  • Consultas antecipadas

De forma similar ao que ocorre com o OEA, as disposições a respeito de consultas ante- cipadas no AFC e no CAM também divergem em grau de ambição entre si.

O mecanismo da consulta antecipada é um processo formal e vinculante sobre uma futura operação dentro de um contexto concreto e específico previamente apresentado pela empresa à autoridade.

O AFC prevê que seus Membros devem emitir soluções de consulta antecipada e deter- mina sob quais condições o mecanismo deve ser disponibilizado. O CAM, por sua vez, traz apenas uma disposição genérica estabelecendo que os titulares de direitos podem formular consultas à Administração Aduaneira sobre aspectos técnicos referentes a um caso concreto90.

Assim, apesar de ambos os instrumentos trazerem disposições sobre o mecanismo, existem divergências entre o AFC e o CAM no que diz respeito à consulta antecipada:

  1. Nível vinculante: o AFC traz a solução de consultas como uma obrigação dos Membros para consultas sobre classificação fiscal e regras de origem91. O CAM, por vez, trata a consulta antecipada como uma faculdade do “titu- lar de um direito legítimo”, sem prever que a Administração Pública deve garantir o acesso seguro e adequado ao

A previsão do CAM é genérica e não trata da vinculação da solução de consulta antecipada, que é um de seus elementos básicos92. Caso não seja vinculante, a solução de consulta consiste em mera recomendação/orientação, sem caráter obrigatório, não trazendo segurança para as operações, como traz o AFC.

 

 

91 Art. 3.9 (a), AFC.

  • A consulta antecipada tem como um de seus principais objetivos trazer mais segurança para as operações de comércio exterior. Para que isso seja possível, é fundamental que a solução de consulta seja vinculante ao operador e à Administração Pública. Isso porque, o entendimento da autoridade que respondeu à consulta deve ser respeitado pelo operador e também ser o mesmo adotado pelo fiscal no momento da importação/exportação.

 

 

 

 

5 OUTROS ASPECTOS RELEVANTES: RELAÇÃO ENTRE CAM E ACORDO DE FACILITAÇÃO DO COMÉRCIO DA OMC

 

 

 

 

 

 

 

  1. Condições para emissão: o CAM também não descreve as condições espe- cíficas sob as quais as soluções de consultas antecipadas devem ser emi- tidas (como faz o AFC), a exemplo da necessidade de solução da consulta em um prazo adequado93, da publicação das soluções94 e a possibilidade de apresentação de pedido de reconsideração95. Ainda, o CAM não prevê em quais situações a Administração Pública pode negar um pedido de solução de consulta antecipada96, deixando essa questão a critério das autoridades

Conforme se observa, a previsão sobre consultas antecipadas no CAM não segue o mesmo padrão do AFC e não está, portanto, adequada do ponto de vista de facilitação do comércio.

É fundamental que os Estados Partes do Mercosul implementem o mecanismo tendo em vista as condições estabelecidas pelo AFC, prevendo, especialmente: i) a obrigação de emissão de soluções de consultas antecipadas para classificação fiscal e regras de origem; ii) a vinculação e publicação das soluções; iii) a emissão de soluções de consulta em um prazo razoável; e iv) a possibilidade de apresentação de pedido de reconsideração.

  • Direito a recurso (art. 174 a 176)

Por fim, o último ponto de diferença entre o CAM e o AFC diz respeito ao direito a recurso diante de decisões tomadas pela administração em relação a operações aduaneiras realizadas por particulares.

Enquanto o AFC deixa claro em seu art. 4 que todos os membros devem garantir que pessoas físicas e jurídicas tenham o direito a recurso administrativo ou de revisão independente ou por autoridade superior a que emitiu a decisão e/ou a direito a recurso judicial a fim de que decisão da autoridade possa ser revisada, o CAM dispõe apenas que:

Art. 174 – Interposição de Recursos

 

Toda pessoa que se considere lesada por um ato administrativo editado peça Administração Aduaneira poderá interpor os recursos cabíveis perante as autoridades competentes.

Em outras palavras, o CAM menciona o direito a recurso, mas não garante o direito de que o pedido de revisão apresentado pela parte será avaliado e julgado de forma inde- pendente, o que, por si só, não respeita as regras do AFC e traz o risco de que ocorra a mera análise para fins de reconsideração pela mesma autoridade que proferiu a decisão – o que raramente surte resultados.

  • Conforme previsto no art. 3.1 do AFC. 94 Conforme previsto no art. 3.6 do AFC. 95 Conforme previsto no art. 3.7 do AFC. 96 Previstas no 3.2 do AFC.

 

 

 

 

CÓDIGO ADUANEIRO DO MERCOSUL: AVANÇOS E IMPACTOS PARA O BRASIL

 

 

 

 

 

 

 

 

Este, portanto, é um ponto de preocupação e que deve ser mais bem discutido dentro do bloco para que as normas regulamentares sejam emitidas para resolver a questão e trazer maior segurança jurídica aos operadores que atuam no comércio do bloco.

De forma a esquematizar as semelhanças e diferenças entre as regras do CAM e do AFC em termos de facilitação do comércio internacional, o quadro 6 apresenta uma comparação entre as disposições de ambos os instrumentos e algumas conclusões relevantes.

 

QUADRO 6 – Comparação entre o CAM e o AFC

 

 

Temas

Nível de Ambição
AFC                                                    CAM
 

Gestão de risco

 

Traz critérios específicos para avaliação de risco.

 

Utilização de Sistemas Informatizados e Cooperação Aduaneira Prevê que a transmissão   de dados por meio de uma

janela única.

 

Uniformização e procedimentos e documentação  

Prevê a criação de um   documento aduaneiro uniforme para o bloco.
 

Elementos de valoração

 

 

Estabelece quais elementos comporão o valor aduaneiro.

 

 

Infrações e penalidades aduaneiras

Tenta definir o que é penalidade e traçar regras gerais como as mesmas devem ser aplicadas de forma a garantir que não se tornem barreiras ao comércio. Omisso sobre a questão das penalidades e os objetivos em comum e que podem ser comprometidos caso isso não seja adequadamente

regulado em âmbito regional.

 

Programa Operador Econômico Autorizado (OEA)

Traz mais detalhes sobre requisitos e benefícios da certificação. Prevê que

o programa OEA é uma obrigação.

 

 

OEA como facultativo.

 

 

Consultas antecipadas

Traz as condições específicas para emissão da consulta antecipada, como a vinculação como requisito essencial. Não aborda essa questão e, sem a vinculação, a solução de consulta torna-se mera recomendação.
 

 

 

Direito a recurso

 

Possui previsão mais robusta garantindo o acesso a recurso administrativo ou de revisão independente.

Não prevê que o recurso deve ser avaliado e julgado de forma independente, com risco, portanto, de o recurso não ser analisado adequadamente e

o direito a recurso não ser de fato garantido.

Fonte: CNI, 2019. Elaboração do autor.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

O CAM propõe diversas mudanças e aperfeiçoamentos

que impactam direta e indiretamente, no cotidiano da Aduana dos Estados Partes do Mercosul

 

 

 

6 IMPACTOS DO CAM PARA O BRASIL

 

 

 

 

 

 

6 IMPACTOS DO CAM PARA O BRASIL

Como exposto ao longo dos tópicos anteriores, ainda que o CAM tenha como escopo consolidar um arcabouço normativo e conceitual para posterior regulamentação e operacionali- zação de regras pelos Estados signatários – não sendo um instrumento com extensas regras concretas e mandatórias, o CAM propõe diversas mudanças e aperfeiçoamentos que impactam direta e indiretamente, no cotidiano da Aduana dos Estados Partes do Mercosul.

O impacto do CAM para o Brasil concentra-se sobre os seguintes pontos:

  • Criação de novos conceitos e critérios e/ou atuali- zação e clarificação dos já existentes

No que se refere aos conceitos e critérios, nota-se que, dife- rente dos demais membros do bloco e do próprio sistema adotado no CAM, o Brasil é o único que não traz em sua prin- cipal fonte normativa, no Regulamento Aduaneiro conceitos claros sobre sujeitos, jurisdição, competências, mecanismos e procedimentos, bem como definições básicas como importação e exportação97.

Ainda que a interpretação das normas brasileiras permita que tais elementos sejam identificados, a ausência de dispositivos claros e mandatórios sobre essas questões possibilita a existên- cia de compreensões e aplicações nem sempre coerentes entre

 

97 Ao avaliar os Códigos Aduaneiros de Argentina (Ley 22.415/1981), Paraguai (Ley 2.422/2004) e Uruguai (Ley 19.276/2014), percebe-se que todos possuem estruturas semelhantes, com uma mesma lógica de organização e conteúdo. Apesar de o código argentino ser bem mais extenso que os demais – possui 1.100 artigos, enquanto o paraguaio possui 398 e o uruguaio aproximadamente 300 –, todos trazem em sua estrutura previsões normativas sobre conceitos relacionados a sujeitos, jurisdição e competências, mecanismos e procedimentos, penalidades, proibições à importação e à exportação e aspectos tributários específicos a essas operações. Assim, percebe-se que o Regulamento Aduaneiro brasileiro se distancia de um modelo de organização e regulação aduaneira minimamente “comum” entre os demais Estados Partes do bloco.

 

 

 

 

CÓDIGO ADUANEIRO DO MERCOSUL: AVANÇOS E IMPACTOS PARA O BRASIL

 

 

 

 

 

 

 

 

  1. Por tal motivo, o primeiro passo para que o Brasil possa absorver os normas do CAM e alinhar seu modelo jurídico ao dos demais membros é a adaptação de sua legislação para que, antes de disciplinar situações e fatos aduaneiros, sejam apresentados e indicados conceitos claros e em linha com as normas do CAM.

Nesse contexto, percebe-se que o CAM traz igualmente uma necessidade de modificação do modelo legal aduaneiro adotado no Brasil e uma oportunidade para que normas antigas e desatualizadas sejam revistas e/ou revogadas, bem como de que seja realizada simplificação e organização das diversas normas em vigor, as quais, por serem emanadas por uma quantidade significativa de autoridades, não raramente são de difícil acesso e compreensão às empresas que atuam no comércio exterior.

  • Necessidade de revisão da maior parte dos regimes aduaneiros especiais atualmente em vigor

Como apontado anteriormente, são muitos e contêm regras e benefícios específicos a setores e situações. Considerando que o CAM traz definição e aplicação dos regimes especiais de forma diversa à prática brasileira, a plena aplicação do CAM implicará a extinção da maior parte dos regimes atualmente em vigor.

Se, por um lado, a padronização de aplicação dos regimes no bloco é algo importante e necessário para que o CAM possa ser aplicado em sua integralidade e produza os efeitos esperados, sabe-se que os regimes especiais em vigor no Brasil têm sido utilizados como ferramentas relevantes para a competitividade das exportações brasileiras e do desen- volvimento de setores-chave da economia, a exemplo de atividades de industrialização e da exploração de petróleo e gás natural.

Nesse contexto, há oportunidade para harmonização dos regimes aduaneiros aplicados pelo Brasil com os de seus pares no Mercosul. Entre os principais ganhos, estão a abrangência na aplicação dos regimes aduaneiros especiais – que deixam de ser restritos a setores, podendo ser aplicados de forma transversal às diversas áreas do mercado.

Outra vantagem reside na simplificação da cobrança e da autorização de regimes, os quais possam a ter por regra a não exigência de tributos aduaneiros em caso de mercadorias cuja importação não seja definitiva, diferentemente do que ocorre atualmente, em que a regra geral é da obrigação de recolhimento até que se prove o enquadramento da operação em uma das situações especiais descritas na legislação.

  • Necessidade de reestruturação e organização das normas sobre comércio exterior

Apesar de não ser nova, ganha força e maior relevância no contexto do CAM. Ao longo dos anos, a legislação aduaneira no Brasil passou por diversas e extensas consolidações, as quais não surtiram o resultado esperado, implicando que normas antigas e desatualizadas

 

 

 

 

6 IMPACTOS DO CAM PARA O BRASIL

 

 

 

 

 

 

 

continuassem em vigor e dificultando a compreensão do universo total de regras aplicáveis aos operadores98.

Apesar de sempre ter havido um esforço por parte das autoridades brasileiras para siste- matizar e atualizar as normas aduaneiras aplicáveis a cada novo Regulamento Aduaneiro publicado, o problema enfrentado é cíclico. Diante da persistência de um modelo norma- tivo e de gestão que incentiva os órgãos atuantes no comércio exterior a legislarem de forma descentralizada e contínua, a mera renovação periódica dos regulamentos nunca conseguiu solucionar a questão. A legislação esparsa faz parte das características da gestão do comércio exterior no Brasil e da produção normativa desarticulada e realizada por múltiplos atores governamentais de forma recorrente, o que leva à recorrente formação de conflitos e ambiguidades sobre a matéria.

Para que o CAM seja incorporado ao ordenamento jurídico brasileiro e possa exercer seu papel de ferramenta para integração e avanço do Mercosul, é necessário que a organização das normas aduaneiras internas seja repensada, de forma a dar ênfase nas normas do CAM e permitir que as demais normas internas, publicadas antes e depois do CAM, interajam de forma harmônica e coordenada entre si.

Avaliando o sistema de normas adotado pelos membros do bloco, contata-se que o Brasil é o único que não possui sistematização e organização de regras aduaneiras por meio de um código, destoando do que ocorre na Argentina, no Paraguai e no Uruguai, os quais possuem códigos aduaneiros consolidados e com estruturas semelhantes em termos de lógica de organização e conteúdo – todos trazem, em sua estrutura, previsões normativas sobre conceitos, mecanismos e procedimentos, penalidades, proibições à importação e à exportação e aspectos tributários específicos a essas operações99.

Entre eles, o Código Aduaneiro Uruguaio (CAU) destaca-se pela atualidade e preocupações trazidas em seu bojo.

  • Afastamento entre a Aduana e a RFB

Um dos impactos do CAM está no afastamento entre as figuras da Aduana e da RFB, o que deve ser visto como um ganho. Diferentemente de outros países100, em que direitos aduaneiro e tributário são exercidos por autoridades separadas, no Brasil a jurisdição

 

 

  • O primeiro regulamento aduaneiro brasileiro foi criado em 1832 por meio do Decreto nº 160, sendo atualizado e reformado por versões posteriores publicadas em 1836, 1860, 1876, 1885, 1985 e
  • Exposición de Motivos del Proyect de Ley de Código Aduanero de la República Oriental del Uruguay (CAROU). 2012. Disponível em: https://www.aduanas.gub.uy/innovaportal/file/10084/1/exposicion_de_motivos.pdf. Acesso em: 20 nov. 2018.
  • São exemplos dos países em que as atividades tributária e aduaneira são conduzidas por autoridades separadas e independentes: Alemanha, Austrália, Bulgária, Canadá, Chile, Chipre, Coreia do Sul, Costa Rica, Croácia, Estados Unidos, Finlândia, França, Hong Kong, Indonésia, Islândia, Itália, Japão, Lituânia, Luxemburgo, Malásia, Nova Zelândia, Noruega, República Tcheca, Rússia, Singapura, Suécia, Suíça e Turquia. Ver: OECD. Tax Administration 2015: Comparative Information on OECD and Other Advanced and Emerging Economies. 2015, 40. Disponível em: <http://www.oecd-ilibrary.org/taxation/taxadministration_23077727>. Acesso em 2 maio 2019.

 

 

 

 

CÓDIGO ADUANEIRO DO MERCOSUL: AVANÇOS E IMPACTOS PARA O BRASIL

 

 

 

 

 

 

 

 

aduaneira no que se refere à fiscalização e ao controle sobre o comércio exterior é exercida pelo Ministério da Fazenda – que desde o início de 2019 foi absorvido pelo Ministério da Economia –, mais especificamente pela Secretaria da Receita Federal101.

Apesar de esse modelo de concentração de competências existir de forma similar em outros países102, observa-se que o Brasil não possui muitas semelhanças com o grupo. Isso porque, ainda que exercidas por uma mesma autoridade, existe a necessidade de que os servidores e as estruturas internas tenham condições de exercer as atividades específicas com eficiência, norteados pelos princípios específicos de cada finalidade, o que não é exatamente observado na prática nacional.

O que se pode perceber no contexto brasileiro é que a cumulatividade dessas atividades reflete uma política aduaneira que ainda apresenta elementos de arrecadação com ins- trumentos de comércio exterior implementados em consonância com as políticas fiscais. Diante disso, apesar do necessário afastamento teórico entre o direito aduaneiro e o direito tributário, a fim de preservar a autonomia de ambos e permitir a ampla compreensão de cada um em seus objetivos e instrumentos próprios, a forma de atuação de grande parte dos controles aduaneiros se confunde com as regras tributárias.

Nesse contexto, a implementação do CAM e a criação de um Comitê Aduaneiro do Mercosul para harmonização e produção integrada de normas aduaneiras entre os membros do bloco trará como benefício indireto a possibilidade de separação das atividades aduaneiras e tributárias, visto que o direito aduaneiro vai muito além do mero direito do Estado de tributar atividades econômicas, se referindo a um conjunto de normas e princípios que regulamentam juridicamente a política aduaneira, de modo a permitir a intervenção dos Estados no intercâmbio internacional de mercadorias, formando um sistema que possibilita o controle governamental com vista à execução de suas políticas públicas – as quais visam garantir os interesses regulatórios legítimos dos Estados, perseguidos dentro de seu policy space e em concordância com as regras e limites multilateralmente estabelecidos, tais quais os objetivos relacionados ao controle sanitário, ao direito dos consumidores e à repressão ao tráfico internacional103.

 

 

 

 

  • O Decreto nº 9.003/2017, dispõe que a competência constitucional contida no art. 237, de que caberia ao Ministério da Fazenda a jurisdição aduaneira no que se refere à fiscalização e ao controle sobre o comércio exterior, foi alocada à Secretaria da Receita Federal, órgão que, de acordo com seu art. 25, é responsável por planejar, coordenar, supervisionar, executar, controlar, avaliar as atividades de administração federal tanto para a esfera tributária quanto para a aduaneira, bem como interpretar e aplicar a legislação sobre ambos os
  • De acordo com a OCDE, os seguintes países concentram atividades aduaneiras em seus órgãos fiscais: Áustria, África do Sul, Argentina, Bélgica, Colômbia, Dinamarca, Eslovênia, Estônia, Grécia, Holanda, Hungria, Irlanda, Israel, México, Portugal, Reino Unido e Romênia. Ver: OECD. Tax Administration 2015: Comparative Information on OECD and Other Advanced and Emerging Economies. 2015, p. 40. Disponível em: <http://wwoecd-ilibrary.org/taxation/tax-administration_23077727>. Acesso em: 2 maio 2019.
  • CARVAJAL, Máximo Contrerás. Derecho Aduanero. México: Porruá, p. 4.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Setor privado e governo brasileiro devem se debruçar sobre uma nova estrutura normativa que atenda aos interesses do país, endereçar as lacunas existentes no CAM, buscar sua aplicação e aprimoramento ao longo

do tempo, liderar a política aduaneira e impulsionar a negociação de um protocolo de facilitação de comércio do bloco

 

 

 

7 AVALIAÇÃO FINAL E RECOMENDAÇÕES

 

 

 

 

 

 

7 AVALIAÇÃO FINAL E RECOMENDAÇÕES

A efetiva implementação do CAM pelo Brasil traz como grande desafio a reestruturação das normas aduaneiras nacionais em termos de sistematização e conteúdo, de forma a permitir maior aproximação com o modelo já adotado pelos demais membros do bloco e criando espaço para que as normas do Código dialoguem, de forma clara, com as normas nacionais.

Diante da análise realizada ao longo do presente estudo, pode-se chegar às seguintes constatações sobre o CAM e o seu impacto para o Brasil:

  • O CAM apresenta-se como uma grande oportunidade para reorganizar, simplificar e modernizar as normas aduaneiras nacionais de modo a garantir que não ocor- ram retrocessos em relação aos avanços obtidos em decorrência dos compromissos internacionais assumi- dos pelo país.
  • O Brasil distancia-se do sistema aduaneiro e de gestão de comércio exterior dos demais membros do bloco, o que é um obstáculo ao avanço do comércio regional. Nesse contexto, o CAM apresenta-se como uma chan- ce de harmonização e aproximação entre os Estados Partes do Mercosul principalmente no que se refere a conceitos e ferramentas – a exemplo de questões afeitas à incidência de tributos aduaneiros e aos re- gimes aduaneiros comuns e aos regimes aduaneiros especiais–, bem como de permitir que o Brasil avalie as boas práticas de seus vizinhos e, a partir da troca de experiências, realize reformas e ajustes necessários à desburocratização do seu sistema
  • O cenário atual de maior abertura comercial do Brasil pode favorecer a implementação do CAM, sobretudo

 

 

 

 

CÓDIGO ADUANEIRO DO MERCOSUL: AVANÇOS E IMPACTOS PARA O BRASIL

 

 

 

 

 

 

 

 

em função dos compromissos com a facilitação do comércio – seja pela ratificação do AFC e das reformas promovidas em seu bojo, seja pela incorporação de novas diretrizes e convenções da OMA, a exemplo da Convenção de Quioto Revisada, seja ainda pela atuação do Confac –, com iniciativas em prol da desburocratização, do aumento da competividade da indústria e da exclusão de regimes especiais em excesso.

  • A ausência de previsão sobre infrações e penalidades no CAM é uma preocupação, tendo em vista que é questão de suma importância para que o sistema aduaneiro do bloco funcione. Se o tema não for endereçado durante o andamento da imple- mentação do Código pelos Estados Partes ou em novos compromissos do bloco, como em um protocolo de facilitação de comércio por exemplo, há risco de que os objetivos do CAM não consigam ser plenamente executados, principalmente se não houver um entendimento comum sobre o que são infrações e qual o nível punitivo que se deve implementar a cada tipo de situação, com vista à determi- nação conjunta do que não pode ser tolerado pelo bloco e em que
  • Ainda que o CAM seja abrangente e enderece a maior parte dos temas e desafios aduaneiros da atualidade, falta maior ênfase, ambição e instruções em questões de ordem prática, como no caso dos sistemas eletrônicos e do documento aduaneiro comum, os quais são meramente mencionados, sem que haja diretrizes concretas de como tais obrigações devem ser executadas pelos Sem essas decisões, o CAM apresenta-se como vantagem em termos normativos individuais para cada Estado, mas não garante que a União Aduaneira sairá do papel.

Considerando o diagnóstico e as conclusões apresentados acima, recomenda-se que o setor privado e o governo brasileiro se debrucem sobre os seguintes pontos, de forma a incentivar a implementação do CAM e fomentar discussões para seu aprimoramento e efetividade em termos práticos:

  • Faz-se necessário que o sistema aduaneiro brasileiro seja, desde já, repensado e que seus principais gargalos, deficiências e pontos dissonantes com o CAM sejam avaliados com vistas a mapear uma nova estrutura normativa que atenda aos interesses do país – de forma a permitir que as prerrogativas extrafiscais da Aduana sejam preservadas (segurança, saúde e bem-estar dos consumidores, gestão de riscos, etc.) – e do setor privado, bem como seja compatível com as regras pactuadas no âmbito do
  • Os Estados Partes devem, o quanto antes, empreender esforços para que normas complementares e regulamentares sejam pensadas e criadas de forma a endereçar lacunas existentes no CAM, a exemplo da ausência de determinação sobre infra- ções e penalidades e de diretrizes sobre elementos de modernização da gestão

 

 

 

 

7 AVALIAÇÃO FINAL E RECOMENDAÇÕES

 

 

 

 

 

 

 

aduaneira, como os sistemas informatizados, os mecanismos de gestão aduaneira, a implementação da declaração única, entre outros, os quais são relevantes para que o sistema funcione.

  • O funcionamento do Comitê Aduaneiro do Mercosul enquanto órgão de gestão e a implementação do CAM em cada Estado Parte deve favorecer a interação com o setor privado, de forma que os diálogos permitam a identificação de gargalos, formas efetivas de colocar o CAM em prática e garantir sua devida aplicação e aprimoramento ao longo do
  • Por fim, recomenda-se que o Brasil aproveite a oportunidade trazida pelo CAM não só para reavaliar suas políticas e estratégicas internas relativas ao comércio exterior, mas que utilize o momento atual para liderar a política aduaneira do bloco, seja pela sua relevância comercial na região e internacionalmente, seja por questões de segurança de suas fronteiras e de políticas de contenção de tráfico, contrabando e outras formas de corrupção.
  • Como há áreas em que o AFC da OMC está mais avançado que o CAM, a internaliza- ção do CAM pelos países não impede a negociação de um Protocolo de Facilitação de Comércio do bloco que, inclusive, deve ser mais ambicioso que o AFC e mais adequado à realidade de uma União

 

 

 

 

ANEXO A – NORMAS RELATIVAS À TRANSPARÊNCIA NO AFC

 

 

 

 

 

 

ANEXO A – NORMAS RELATIVAS À TRANSPARÊNCIA NO AFC

Dada a importância e necessidade de harmonização, sistematização e clareza normativa para o ambiente de negócios dos países, o Acordo sobre Facilitação do Comércio (AFC) da Organização Mundial do Comércio (OMC) – que tem como objetivo a simplificação, a modernização e a harmonização das operações de comércio exterior entre seus mem- bros – contém diversas regras sobre transparência e publicação de normas relativas ao comércio exterior realizada entre seus membros, que devem ser razoáveis e uniformes, conforme se observa no quadro 7 a seguir.

 

QUADRO 7 – Normas relativas à transparência no AFC

Fonte: Acordo de Facilitação de Comércio da OMC.

 

 

 

 

CÓDIGO ADUANEIRO DO MERCOSUL: AVANÇOS E IMPACTOS PARA O BRASIL

 

 

 

 

 

 

 

 

Uma avaliação sobre o baixo desempenho dos Estados Partes do Mercosul pode ser verificada nos indicadores de desempenho de facilitação do comércio elaborados tanto pela Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE)104, quanto pelo Fórum Econômico Mundial (WEF, na sigla em inglês)105, como podemos observar nos gráficos 1106 e 2107.

Tais indicadores têm como objetivo identificar o status atual do desenvolvimento dos mecanismos para facilitar o fluxo de comércio em cada país e os espaços para melhoria em cada um deles. Portanto, o desempenho relativamente ruim em tais indicadores torna a harmonização, a sistematização e a clareza normativa ainda mais importante no Mercosul.

 

GRÁFICO 1 – Indicadores de Facilitação OCDE

Argentina

 

 

 

Pior Nota                                                                                               Brasil

 

Desempenho Médio Em Facilitação do Comércio (0-2)

 

Disponibilização de Informações (0-2)

 

 

Melhor Nota                                                                                               Paraguai

 

 

 

Uruguai

 

Fonte: OCDE (2017) .

 

 

 

 

 

 

 

  • Cabe esclarecer que, de acordo com a metodologia adotada pela OCDE no levantamento e análise das informações, as notas fornecidas variam de 0 a 2,0, sendo 0 atribuído para situações em que “procedimentos de importação e exportação não são descritos e os formulários e documentos exigidos não são disponibilizados de maneira a permitir a realização das etapas básicas dos procedimentos”; 1,0 para “procedimentos de importação e exportação são descritos e os formulários e documentos exigidos são disponibilizados de maneira a permitir a realização das etapas básicas dos procedimentos”; e 2,0 para “existência de guias com resumos e/ou destaques específicos sobre esses tópicos”. Ver OECD. Trade Facilitation Indicator Simulator. Disponível em: https://sim.oecd.org/Simulator. ashx?lang=En&ds=TFI&d1c=lac&d2c=bra&d2cc=bp. Acesso em: 11 2019.
  • De forma semelhante à metodologia da OCDE, o Fórum Econômico Mundial realiza levantamento e análise de informações atribuindo notas dentro da escala de 1 a 7 com relação às práticas e políticas nacionais de facilitação do comércio, sendo a nota 1 atribuída para “prática muito comum” e 7 atribuída para “nunca ocorre”. Ver: WORLD ECONOMIC Global Enabling Trade Report. Disponível em: http://reports.weforum.org/global-enabling-trade-report-2016/economy-profiles/. Acesso em: 11 jan. 2019.
  • Trade facilitation indicators. Disponível em: http://www.oecd.org/trade/facilitation/indicators.htm. Acesso em: 11 jan. 2019.
  • WORLD ECONOMIC FORUM. Global enabling trade report. Disponível em: http://reports.weforum.org/global-enabling-trade- report-2016/economy-profiles/. Acesso em: 11 2019.

 

 

 

 

ANEXO A – NORMAS RELATIVAS À TRANSPARÊNCIA NO AFC

 

 

 

 

 

 

 

GRÁFICO 2 – Indicadores de Facilitação (WEF)

Argentina

 

 

 

 

Pior Nota                                                                                                         Brasil

 

Desempenho Médio em Facilitação do Comércio (1-7)

 

Eficiência e Transparência da Autoridade Aduaneira (1-7)

 

 

Melhor Nota

Paraguai

 

 

 

 

Uruguai

 

Fonte: Fórum Econômico Mundial (2016) .

 

 

CNI

Robson Braga de Andrade

Presidente

 

DIRETORIA DE DESENVOLVIMENTO INDUSTRIAL

Carlos Eduardo Abijaodi

Diretor de Desenvolvimento Industrial

 

Gerência Executiva de Assuntos Internacionais

Diego Zancan Bonomo

Gerente-Executivo de Assuntos Internacionais

 

Gerência de Política Comercial Constanza Negri Biasutti Gerente de Política Comercial

 

Alessandra Cristina Mendonça de M. Matos Felipe Augusto Torres de Carvalho

Leandro Ismael Salles de Barcelos Ronnie Sá Pimentel

Viviane Aversa Franco

Equipe Técnica

 

Gerência de Negociações Internacionais

Fabrizio Sardelli Panzini

Gerente de Negociações Internacionais

 

Allana Macedo Rodrigues Carolina Telles Matos

Marina Isadora Barbosa Souza

Equipe Técnica

 

DIRETORIA DE COMUNICAÇÃO DIRCOM

Ana Maria Curado Matta

Diretora de Comunicação

 

Gerência de Publicidade e Propaganda

Armando Uema

Gerente de Publicidade e Propaganda

 

Walner Oliveira

Produção Editorial

 

DIRETORIA DE SERVIÇOS CORPORATIVOS – DSC

Fernando Augusto Trivellato

Diretor de Serviços Corporativos

 

Superintendência de Administração SUPAD Maurício Vasconcelos de Carvalho Superintendente Administrativo

 

Alberto Nemoto Yamaguti

Normalização

 

Veirano Advogados Fernanda Kotzias Marina Martins Martes Consultoria

 

Danúzia Queiroz

Revisão Gramatical

 

Editorar Multimídia

Projeto Gráfico e Diagramação

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

.cni.com.br

 

 

/cnibrasil

 

 

@CNI_br

 

 

@cnibr

 

 

/cniweb

 

 

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